domingo, 27 de dezembro de 2015

Natal e Ano Novo - A constatação dos dissabores anuais

Florbela Espanca
O meu talento!... De que me tem servido? Não trouxe nunca às minhas mãos vazias a mais pequenina esmola do destino. Até hoje não há ninguém que de mim se tenha aproximado que me não tenha feito mal. Talvez por culpa minha, talvez... O meu mundo não é como o dos outros, quero de mais, exijo de mais, há em mim uma sede de infinito, uma angústia constante que eu nem mesmo compreendo, pois estou longe de ser uma pessimista; sou antes uma exaltada, com uma alma intensa, violenta, atormentada, uma alma que se não sente bem onde está, que tem saudades... sei lá de quê! (Florbela Espanca, Desafinado Desconcerto: Contos, Cartas, Diários. Iluminuras, 2002. P. 271)

Florbela é uma achado. Assim como Augusto dos Anjos e sua poesia cortante e realista em metáforas negras, ela aproxima-se de mim com a alma parecida, uma vida de angústia e decepções.

E, nesse final de ano (com o Natal que passou e o Ano Novo que aproxima-se), mais constatações da minha vida: minuciosamente detalhada em seus poemas.

Veja o destaque, frase perfeita, avassaladora e ratificadora: Até hoje não há ninguém que de mim se tenha aproximado que me não tenha feito mal. Talvez por culpa minha, talvez... E assim o é - sem delongas e sem drama, apenas a verdade nua e crua. 

Natal é uma época para a família. Sim, aquelas de comercial ou das pessoas felizes e bobas, satisfeitas com o raso, o multicolorido instantâneo e suas vidas recheadas com sopa de orfanato. A felicidade parece bombom de quinta comprado com moeda de um centavo. 

Natal também lembra-me esperança, o menino Jesus, os desenhos católicos e o catecismo. Era a época em que eu podia ser tudo, claro, na imaginação. Quando somos pequenos, mesmo com as mazelas do dia a dia, as perseguições, pobreza e o destrato na escola (bullying de hoje), o espírito inquietante e a esperança são o mais tenro combustível da alma. Poderíamos, para sempre, ser infantes, ou, ao menos, ter um ínfimo do brio de outrora só para sobrevivermos com o mínimo de dor. Porém crescemos e enxergamos o mal, o preconceito, o descaso e o descarte.

As ceias, antes esperadas, só mostram agonia, problemas domésticos, queixumes. A grande maioria das pessoas que amo e gosto, e que gostaria que estivesse ao meu lado nesse momento, tem outras prioridades, outros amigos mais importantes, outros amores. Muitos deles enganaram, viram apenas algo passageiro, um número, uma nota musical solitária para coleção particular. 

Foi um ano terrível, cheio de tristeza e pesar. Apunhaladas, fofocas, pessoas insanas, coração partido e toda sorte de desgosto. Seres humanos ruins foram coroados, idolatrados e elogiados. E vivem agora seus contos de fada - com beleza, riqueza, belos rebentos, atenção e glorificação. 

Amar tornou-se difícil. E os fracassos apareceram - controle, crítica e dizeres para alimentar a baixa auto estima. Não amei este ano - foram 365 dias estéreis. E não lembro-me de uma época assim. E espero não ter nada parecido por anos. 

Sinto-me presa. Aliás, sempre estive. Sou escrava das convenções, dos dramas alheios, das imposições dos outros. Não tenho dinheiro e nem um rumo certo. Vivo de lampejos de felicidade imaginária e sorrisos soltos. Estes, aliás, causados por pessoas não próximas; talvez, as melhores e mais sensatas que já entraram em minha vida. 

A vida como ela é - cinza. 

Mas quero chuva. Porque ela possui o mais belo céu, o cheiro enebriante de terra gotejada, frio, eletricidade e, antes, bem antes, o arco-íris da infância, cheio de Matemática e Física. Portal de frenesi, palco de cores em tons pastéis. É um espetáculo raro por estes tempos.

Há apenas raios cegantes de sol, com cores vivas e artificialmente alegres, enjoativas. Sem bases e discussões. 

[Fale-me de Beatles, dos Celtas, qualquer ato sólido e artístico. Tire-me desse mar de lama alheio! Ofereça-me uma café com leite quente e um bolinho boliviano. Seja um estranho encantador, alguém para sempre, mesmo por instantes.]

Hoje, pós-natal, e depois que todos comeram como animais, pensando em Papai Noel (minha época favorita ainda é a Páscoa, ao menos, lembram de Jesus), estou com mais um episódio forte de dor nas costas. Existem dias com menos dor, porém ela sempre está lá - companheira inseparável. A cronicidade do meu dia a dia.

Das coisas boas, uma descoberta incrível: um musicista celta - Greg Joy. Também voltei a assistir Arquivo-X e tem sido muito divertido. Agora toco Flauta Nativa Americana - NAF que amo e acalma-me (ninguém nunca me deu forças para tocá-la e assim que o fiz, muitas críticas vieram, não porque eu toco mal, pelo contrário, e sim desdenhos ou o velho descaso, fora que ela é considerada um objeto que ocupa espaço, muito indesejável no começo). 

O curso de Física continua um show de horrores, claro, para mim (porque NUNCA vão dizer algo parecido, afinal, cada um cuida da sua própria vida acadêmica e esses assuntos são terminantemente proibidos. A premissa é que somente os fortes sobrevivem, pois fazem parte disso o egoísmo e também a falta de apoio). Contudo é como disse um amigo e jovem escritor certa vez para mim - Termine isso! E tire sua bunda daí! Não há nada que te segure, não há raízes, não há nada espetacular e forte. Só que é bem difícil manter-se na linha e focada. São tantos problemas, tanta desarmonia e a falta de uma figura para admirar. Episódios recorrentes de desrespeito acontecem, a última, e que me abalou muito, eu já contei em uma postagem anterior.

Vista área de Newgrange - Irlanda
Uma vez terminada toda essa jornada excruciante, poderei começar uma nova vida, longe, muito longe daqui, sem levar nada e ninguém na bagagem. Sem laços, sem história, apenas a vontade de
recomeçar. 

Essa é minha única promessa para o novo ano. Difícil? Exato. É a chave da minha liberdade, minha chance de renascer e poder ter fé em mim, no meu talento. O preço é alto, nada mais que o esperado. Aqui, agora, não há pessoas que acreditem em mim. Essa tarefa é somente minha.

Raio de luz em Newgrange, Solstício de Inverno
Desejo a todos (as) os leitores (as) um ano mais calmo e produtivo. A paz é a lacuna a ser preenchida e a saúde, pois bem sei, é essencial. Do resto, cada um precisa ter ou arrancar da alma, mesmo que seja dolorido. 

E, dessa forma, que as nossas vidas possam ser como a luz que entra em Newgrange a cada Solstício de Inverno - o lembrete da esperança que nunca falha!





Uma linda música celta de Greg Joy!


quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Conversas de ônibus...

O transporte coletivo é motivo de impropérios e maldições dia após dia, em todas as manhãs, tardes e noites quentes e abafadiças. Por outro lado, não há maneira mais significativa de observar o comportamento das pessoas, em seu melhor ou o seu pior.

O pior, todos nós, usuários, sabemos muito bem, desde a tenra idade. O melhor, além dos acontecimentos hilários, sem marcas de violência, são as conversas provenientes daqueles que nunca vimos na vida (e, muito provavelmente, nunca voltaremos a ver nesta mesma).

Pois bem, era uma ensolarada e aguada tarde, um inferninho, antes dos acontecimentos fatídicos da aula grosseira. Estava pensando em fazer uma torta, daquelas americanas, cheias de filamentos, tipo desenho do Pica-Pau. E o mocinho vendedor de revistinhas entrou e leu exatamente os meus pensamentos. Comprei, pela bagatela de R$ 1,00, várias receitas de adoráveis e apetitosas tortas.

Foi assim, notando a compra empolgada, que a moça ao lado (que antes falava sobre aulas, alunos e alienígenas ao telefone) começou uma conversa muito interessante:

 - Não sei cozinhar! Até fiz um curso de culinária...
 - Eu também não! Respondi prontamente.  - Mas essas tortas eu quero fazer.

Ela continuou...

 - Quem cozinha em casa é o meu marido. O meu pai também é um ótimo cozinheiro. Trabalho o dia todo e o meu marido apenas à noite. Quando chego em casa, tudo está pronto. Eles cozinham divinamente bem. Às vezes meu pai manda comida.

Eu já estava, a essa altura, maravilhada!

 - Que bacana! Isso é realmente fantástico!


 - Sim, ele casou comigo sabendo! Como eu disse, eu não sei cozinhar, lavo mal a minha roupa. E aí perguntei a ele, você quer mesmo assim? E estamos juntos há 13 anos.

E eu amei instantaneamente toda a história...

 - Ainda bem que os tempos mudaram! Isso é motivador!

Porém, todos os relatos chegam ao fim, e esse tinha uma parada de ônibus para terminar.

 - Tenho quer ir! Tchau!!!

E ela, simpaticamente, respondeu:

 - Tchau, boa aula!

Bem, como sempre vejo nos comentários das páginas feministas que sigo, não é questão de ser relapsa e sim modificar o pensamento patriarcal e machista: lava quem sujou e cozinha quem sabe. Dividir as tarefas é a cartilha da nova e sensata família.

Óbvio que ainda vão existir as defensoras e os defensores da família tradicional arcaica, da comida servidinha para o marido, passar, lavar e cozinhar como boas Amélias. Haverá os homens que têm medo das feministas e como arma sórdida, vão falar que são mal amadas, solitárias, etc, etc. Só que o bálsamo da vez é presenciar os preconceitos que caem e as amarras que são desfeitas, devagar, mas constantemente.

13 anos é um número e tanto, significativo e emblemático.

E contra dados, fatos e números, não há argumentos (pelo menos, genuinamente, inteligentes e sensatos).

Uma boa história deve ser partilhada, assim como deliciosos pedaços de torta.

E, agora, quem pode conosco, hein? 


terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Das aulas e suas desmotivações (grosserias e outros aspectos...)

Final de ano... E seriam as férias o descanso para os mais variados tipos de mente. Contudo isso não é o que acontece por essas bandas de cá.

Foram alguns meses de greve e eu pensei que estaria revitalizada para mais um período chocante. Um engano tremendo!

[Pergunto-me se essas situações que descreverei a seguir acontecem, em grande número, em um mundo civilizado, em um país desenvolvido. Se assim for, então a Terra é mesmo uma droga e não há nenhum tipo de esperança na vida futura; nem mesmo aquela relatada em romances.]

Ah, Astronomia! Quando olhava o céu e sua Via Láctea brilhante e leitosa, não imaginava que tudo isso poderia ser um inferno sem tamanho. Mas cá estou eu...

A pior sensação para um aluno humanizado e sensível é ser humilhado de alguma forma em público. E isso acontece tanto por aqui que muitos consideram uma rotina normal - literalmente, um cafezinho após as refeições [até alunos que estão agora no Mestrado, em alguma parte desse país, de alguma forma, são mencionados em passagens degradantes intelectualmente e viram histórias tristes repassadas ano após ano.].

Pois bem, hoje foi um dia em que repensei, seriamente, em todas as minhas escolhas. Diante das grosserias de um professor [já conhecido por este fator], tive que conter toda a minha indignação e imaginar - isso é passageiro.

[paciência e compreensão são moedas de ouro raras em Física - Ou um sinal de fraqueza?]

Somos culpados por eles, em grande parte, nossos medos alimentam-os.

Eu sabia ditar aquela maldita equação, mas, como um ser falho, esqueci-me do nome de um mero vetor. E isso foi a minha sentença nesse dia. Fui rebaixada a um micróbio e pensei - "Vou virar uma daquelas histórias tristes?".

Fui beber uma água, pensar, respirar e catar alguns raios de Sol. Eu só tenho uma vida e não posso estragá-la assim [não mais!] por conta de grosserias daqueles que não significam nada nela.

É difícil encarar, como não não? As dificuldades triplicam, montanhas elevam-se e os momentos tornam-se horrorosos.

Por outro lado, vejo que é possível dar conteúdos difíceis se você tem carisma, boa vontade, menos orgulho e fé. Alguns exemplos estão agora disponíveis - o frescor da iniciação! Por quanto tempo isso durará? O suficiente para mostrar que é realizável já está de bom tamanho.

Escrevendo agora, não sei qual será minha atitude daqui para a frente. Mas não posso dizer que esquecerei e deixarei passar. Afinal, tudo que vai, volta... Certeiramente. É só questão de esperar o momento propício e os acontecimentos. À vezes, o próprio destino encarrega-se de fazer vigorar a Lei.

Vou comer Sushi e abrir uma Pepsi gelada - e por hoje, e só por hoje, vou abstrair este fatídico dia.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Cruz

Odeio minúcias, trabalhos domésticos, manias de assepsia. Tudo contado, minimalista, cheio de opressão, regras, mesquinharias e maldade.

Assim é por perto. A vida toda foi assim. E, agora, muito pior.

Todo os dias são de má sorte e a vida é ruim, sem brio e sem esperança.

Acidentes que acontecem dentro de casa por pouca coisa e trazem a desgraça e a tristeza; pessoas que entram, invadem o espaço e alma, acusam, desdenham e carregam toda a negatividade e o fardo pesado de um mundo horroroso e sombrio.

[raiva, rancor... Um poço de lama!]

O amor não existe [para alguns, sim, afortunados!].

Eu só queria desaparecer.

Quem sabe virar um raio de luz...

Muitos desejam morrer. Porém, como idiotas, ainda restam-lhes fé no amanhã. E esse [dia após dia] nasce com um Sol enegrecido, trazendo os piores sentimentos. 

Estamos no limbo, vendo a vida passar, sufocante, acusadora, pecadora e não há nada que se possa fazer para amenizar a dor.

[Prevejo dias de imensa tristeza e pesar.]

Viver é a pior arte, sarcástica, tóxica e agressiva.

Não há dinheiro e nem para onde ir. Estou presa... E todas as cores apagaram-se. 

Vida maldita!

E, no final das contas, é a única coisa que é realmente minha.

Não tenho nada além dela. 

E, disso, estou longe de vangloriar-me.

Porque essa é a minha cruz e também o meu calvário.

domingo, 13 de dezembro de 2015

Da saudade de tempos imemoriais de outras vidas...

Estudar Exatas tem sido um grande desafio. Não tanto pela Ciência em si, que é bela e cheia de perseverança [apesar das vaidades que nunca entenderei]. A falta de espiritualidade de todos ao redor é um espinho pontiagudo.

Todos são de ferro e feitos de palavras agressivas soltas cronometradamente em larga escala. Cenários de disputas, mesquinharias e incompreensão. Ao mesmo tempo, são pálidos e frios, sem mistério, sem sal e muito menos açúcar. É como olhar grandes recipientes vazios encrustados de números e quantidade, fórmulas e desdenhos.

Há assuntos que não gosto de discutir [ou, ao longo do tempo, aprendi a evitar]. São eles, religião e política.

Assim que entrei no curso, foi dada-me a seguinte máxima: "religião não combina com Física.". Fiquei com isso na minha cabeça por muito tempo.

Pensei nos cientistas do Vaticano, Latim, Isaac Newton e todas as possibilidades românticas e poéticas de uma vida que pode ser clara, tranquila, espiritual, buscando o conhecimento sobre o mundo e sobre si mesmo. Contudo parece um assunto proibido, só murmurado em coxias, na calada da noite. Sinto-me numa fábrica ideológica imposta - ser e ser - não é uma questão, é a própria vida.

Dentro do meu próprio mundo, eu sou um paradoxo. Sou católica e acredito em reencarnação. Gosto da propriedade investigativa dos  Dr. Ian Stevenson (já falecido) e o Dr. Jim B. Tucker (Psychiatry and Neurobehavioral Sciences - The Division of Perceptual Studies - University of Virginia - School of Medicine)Do outro lado, meu modelo de profissional é o Carl Sagan - cético e divulgador nato da ciência, não a apavorante, e sim  aquela de um mundo que não precisa ser complicado, basta amá-lo para entendê-lo (igualzinho a Olavo Bilac que aconselhava a amar as estrelas para compreendê-las...).

Em nenhum momento entrei em conflito com esses dois mundos. A coexistência é a chave para a paz.

Sinto, cada dia mais, que aqui não é o lugar, o meu. Não consegui criar raízes e belas histórias. Não sinto saudade.

Falta-me o sentimento vivo e intenso. E ele existe e viveu ardentemente em mim.

Muitas pessoas alegam ter memórias de outras vidas (geralmente aparecem na infância, antes dos 7 anos). Outras sentem a falta inexplicável de algo que não viveram - um fragmento de uma vida esfuziante de outrora, de outro tempo, imemorial e longínquo.

Revendo Arquivo-X (1993-2001), cada vez mais identifico-me com o Fox Mulder. E, todos que assim se sentem, têm medo de, no meio acadêmico, acabarem com a reputação de estranho, louco e desacreditado.

O assunto vidas passadas também foi abordado na série - os carmas, pessoas que continuam ao nosso lado, as mesmas missões, os mesmos pecados e defeitos, inimigos, amigos e amores.

Hoje sinto-me letárgica. Não há um grande amor ou laços de amizades intensos. E assim é essa caminhada há alguns anos.

As perguntas permanecem abertas e as respostas perdidas. Porém há tantas histórias para serem vividas e redescobertas. Em algum lugar vaga, com a mesma impressão, alguém que também sente que um pedaço dessa vida está ligada a outras que, nesse momento, ocultam-se em labirintos que deixam escapar somente a sensação de que a alma é imortal e imutável.

Não se vive para sempre.
Vive-se várias vezes...


***

Este é o tema do filme para TV Minha Vida Na Outra Vida (Yesterday's Children - 2000/EUA/França). Ele foi inspirado no livro autobiográfico de Jenny Cockell. O Livro de Jenny, Yesterday’s Children: The Extraordinary Search for My Past Life Family (1993), relata suas lembranças de uma vida passada e sua jornada para reunir seus filhos de ontem que deixou ao morrer na Irlanda de 1932. O filme conta com Jane Seymour (a famosa Dr. Quinn e do belo filme Em Algum Lugar do Passado), Clancy Brown (Highlander e Sleepy Hollow) e o grande ator Hume Cronyn (que foi, também, marido de Jessica Tandy).

O tema é cantado por Jenn Mahoney e chama-se A Dream That Only I Can Know. Tem uma parte cantada em gaélico irlandês e outra em inglês - um trecho abaixo traduzido (Letra da música aqui).



"Escute o meu coração
E como ele segue um sonho
E ele leva a um lugar
Que somente eu conheço 
Para conhecer meu coração 
É preciso seguir um sonho 
Um sonho que apenas eu posso conhecer." 


domingo, 22 de novembro de 2015

Aniversário: fazer 30 anos


Eu pensei que ia ser mais assustador... Não sei, talvez seja estranho, de fato. Por quê? Porque antigamente era o atestado de uma vida pacata, família constituída, um emprego público, servidão doméstica... Os tempos mudaram [ainda bem!] e nós, mulheres, ainda temos que viver a nossa juventude plena, despojada e livre. A idade não tem um peso, o pensamento dos outros sim; e os nossos são bem mais fortes se formos avaliar bem o que queremos. 

É o auge. 

E tem-se que enxergar isso mais além - o ápice da beleza, o começo da maturidade, o caminho mais reto para a vida.

***


Fazer 30 anos

Affonso Romano de Sant'Anna


QUATRO pessoas, num mesmo dia, me dizem que vão fazer 30 anos. E me anunciam isto com uma certa gravidade. Nenhuma está dizendo: vou tomar um sorvete na esquina, ou: vou ali comprar um jornal. Na verdade estão proclamando: vou fazer 30 anos e, por favor, prestem atenção, quero cumplicidade, porque estou no limiar de alguma coisa grave.

Antes dos 30 as coisas são diferentes. Claro que há algumas datas significativas, mas fazer 7, 14, 18 ou 21 é ir numa escalada montanha acima, enquanto fazer 30 anos é chegar no primeiro grande patamar de onde se pode mais agudamente descortinar.

Fazer 40, 50 ou 60 é um outro ritual, uma outra crônica, e um dia eu chego lá. Mas fazer 30 anos é mais que um rito de passagem, é um rito de iniciação, um ato realmente inaugural. Talvez haja quem faça 30 anos aos 25, outros aos 45, e alguns, nunca. Sei que tem gente que não fará jamais 30 anos. Não há como obrigá-los. Não sabem o que perdem os que não querem celebrar os 30 anos. Fazer 30 anos é coisa fina, é começar a provar do néctar dos deuses e descobrir que sabor tem a eternidade. O paladar, o tato, o olfato, a visão e todos os sentidos estão começando a tirar prazeres indizíveis das coisas. Fazer 30 anos, bem poderia dizer Clarice Lispector, é cair em área sagrada.

Até os 30, me dizia um amigo, a gente vai emitindo promissórias. A partir daí é hora de começar a pagar. Mas também se poderia dizer: até essa idade fez-se o aprendizado básico. Cumpriu-se o longo ciclo escolar, que parecia interminável, já se foi do primário ao doutorado. A profissão já deve ter sido escolhida. Já se teve a primeira mesa de trabalho, escritório ou negócio. Já se casou a primeira vez, já se teve o primeiro filho. A vida já se inaugurou em fraldas, fotos, festas, viagens, todo tipo de viagens, até das drogas já retornou quem tinha que retornar.

Quando alguém faz 30 anos, não creiam que seja uma coisa fácil. Não é simplesmente, como num jogo de amarelinha, pular da casa dos 29 para a dos 30 saltitantemente. Fazer 30 anos é cair numa epifania. Fazer 30 anos é como ir à Europa pela primeira vez. Fazer 30 anos é como o mineiro vê pela primeira vez o mar.

Um dia eu fiz 30 anos. Estava ali no estrangeiro, estranho em toda a estranheza do ser, à beira-mar, na Califórnia. Era um homem e seus trinta anos. Mais que isto: um homem e seus trinta amos. Um homem e seus trinta corpos, como os anéis de um tronco, cheio de eus e nós, arborizado, arborizando, ao sol e a sós.

Na verdade, fazer 30 anos não é para qualquer um. Fazer 30 anos é, de repente, descobrir-se no tempo. Antes, vive-se no espaço. Viver no espaço é mais fácil e deslizante. É mais corporal e objetivo. Pode-se patinar e esquiar amplamente.

Mas fazer 30 anos é como sair do espaço e penetrar no tempo. E penetrar no tempo é mister de grande responsabilidade. É descobrir outra dimensão além dos dedos da mão. É como se algo mais denso se tivesse criado sob a couraça da casca. Algo, no entanto, mais tênue que uma membrana. Algo como um centro, às vezes móvel, é verdade, mas um centro de dor colorido. Algo mais que uma nebulosa, algo assim pulsante que se entreabrisse em sementes.

Aos 30 já se aprendeu os limites da ilha, já se sabe de onde sopram os tufões e, como o náufrago que se salva, é hora de se autocartografar. Já se sabe que um tempo em nós destila, que no tempo nos deslocamos, que no tempo a gente se dilui e se dilema. Fazer 30 anos é como uma pedra que já não precisa exibir preciosidade, porque já não cabe em preços. É como a ave que canta, não para se denunciar, senão para amanhecer.

Fazer 30 anos é passar da reta à curva. Fazer 30 anos é passar da quantidade à qualidade. Fazer 30 anos é passar do espaço ao tempo. É quando se operam maravilhas como a um cego em Jericó.

Fazer 30 anos é mais do que chegar ao primeiro grande patamar. É mais que poder olhar pra trás. Chegar aos 30 é hora de se abismar. Por isto é necessário ter asas, e sobre o abismo voar.


(A Mulher Madura, Editora Rocco, Rio de Janeiro, 1986, pág. 36.)

Fontes:

Fazer 30 anos - Affonso Romano de Sant'Anna - Releituras

domingo, 8 de novembro de 2015

Face

Olhei-me e não gostei.
Era manhã e vi um panda.
Não! Um biscoito maria!
 - Rotina torturante.

[as belezas, juventudes, novidades...
E, ao meu redor, um espaço cada vez
mais sufocante.]

Poderia pintar-me de todas as cores.
Ser um camaleão!

Segundas, serei azul.
Terças, amarelo radiante.
Quartas - verde natureza
E quintas - violeta enebriante.

Sextas, vermelho furor.
Sábados, rosa, o puro amor.
Domingos... Branco e recomeço.

[Essa minha face
Que o espelho transforma em quimera,
Necessita enxergar além...]

Acordei!
E, finalmente, vi todas as cores.
Agora, basta usá-las...
E ser tudo que sonhei.

T.S. Frank

terça-feira, 3 de novembro de 2015

Manuscritos Iluminados – Tesouros da Idade Média

Cena do filme O Nome da Rosa/1986
"Basicamente eu diria que as iluminuras estavam lá não como uma explicação, ou até mesmo como uma ilustração, mas como um modo de adicionar valor a Palavra de Deus." (Professora Germaine Greer, Universidade de Cambridge, documentário Illuminations Treasures of the Middle Ages - BBC)

Os livros modernos são uma comodidade. Cada texto é reproduzido mecanicamente em larga escala - um objeto reivindicado para o consumo das massas. Mas há muito tempo, quando cada livro era único e feito à mão, a palavra tinha uma espécie de magia e poder sobre ele. Por mais de 1000 anos, os manuscritos iluminados trouxeram estórias de mitos e lendas para a vida. Suas páginas brilhantes preservaram ideias das crenças religiosas e muitos mistérios sobre a Idade Medieval. E eles são muito importantes, pois contêm a maior parte da arte requintada medieval e cultura da Europa antes do século XVI.

1. Primórdios

Cena do filme O Nome da Rosa/1986
Quando o Cristianismo chegou até Roma, foi perseguido. Porém, gradualmente, a Religião Cristã cresceu no interior do próprio Império do século IV. Esse Cristianismo já não era mais o das pequenas comunidades, como no início - estava hierarquizado e modificado. Com o Edito de Milão (313 D.C., com o Imperador Constantino), foram asseguradas a tolerância e liberdade de culto para todos os cristãos no território do Império Romano. Em 380 D.C., o Imperador Teodósio decretou que a religião oficial do Império seria o Cristianismo e o mesmo, antes de morrer, em 395 D.C., instaurou duas capitais do Império – Constantinopla, no Oriente, com a Língua Grega - E Roma, no Ocidente, com a Língua Latina.

Quando o Império Romano do Ocidente esfacelou-se, apenas o Cristianismo Romano, na forma da Igreja Católica, sobreviveu. Com as Invasões Bárbaras, uma nova questão foi colocada – como cristianizar esses povos? Eles não eram analfabetos, eles simplesmente eram ágrafos – não tinham escrita. Então a necessidade de evangelizar esses povos tornou-se urgente. Paralelo a este movimento, alguns cristãos afastaram-se do mundo, concentrando-se em monastérios, com regras e trabalhos permanentes. Foram os monasticistas que dedicaram sua vida a religião, ao culto, as privações, as obrigações de voto e, principalmente, aos manuscritos iluminados.

2. Os primeiros mosteiros

O primeiro mosteiro apareceu no Egito, no deserto, com Santo Antão, no século IV (350 D.C.). E o primeiro mosteiro na Europa surgiu na parte Ocidental, no Monte Cassino, Itália, por São Bento de Núrsia, em 529 D.C., originando a Ordem dos Beneditinos.

Evangelhos de Lindisfarne - Iluminura
insular - Mosteiro da Inglaterra na
Ilha de Lindisfarne (hoje Holy Island) – 

Nortúmbria
No interior desses mosteiros, apareceu uma manifestação artística de monges feita para monges – as Iluminuras. E essas não tinham nenhuma finalidade de proselitismo. Eram cópias feitas para adornar os altares e para serem vistas pelos olhos de Deus – a Glorificação da Divindade.

3. As Iluminuras

O termo iluminura está ligado ao verbo latino illuminare (iluminar). O termo, no século IX, começou a ser utilizado pelos autores medievais para designar qualquer tipo de ornamentação ou ilustração de manuscritos. Neste sentido, illuminare significa destacar (tornar luminoso), através da imagem que determina certos aspectos do texto (para alguns autores este termo só é aplicado quando é utilizado o ouro ou a prata na pintura.). A palavra iluminura também é chamada de miniatura por alguns estudiosos que a fazem derivar da palavra latina minium (vermelho) e do verbo miniare que significa escrever a vermelho.

3.1 Do papiro ao códice

O papiro surgiu no Egito e era feito de fibras vegetais (há papiros desse material datados do século 27 A.C., achados na cidade de Tebas). E foi este papiro que chegou, no século 7 A.C, na cidade grega Pérgamo (hoje Bérgamo, na Turquia). No século 3 A.C., surgiu, então, o pergaminho (em homenagem a cidade) - um suporte para a escrita feito com couro de animais jovens (geralmente carneiro, cabra ou vitelo), tratado com água de cal, esticado ao sol e depois raspado com pedra vulcânica.

A vantagem do pergaminho em relação ao papiro é que o primeiro suportava a inscrição no verso e podia-se apagar também. Para escrever usava-se plumas, geralmente de gansos.

Entre o século III e IV D.C., esse pergaminho chegou na Europa Ocidental e foi utilizado nos mosteiros para cópia e ilustrações de livros. No século IV D.C., ele foi transformado em páginas retangulares e depois costurado. Assim surgiu o códice, que revolucionou o processo de transmissão da escrita, facilitou o transporte, a produção e conservação de imagens, já que no rolo as camadas de pintura estalavam frequentemente com o sucessivo enrolamento dos manuscritos.

[Até o século XV, o grande suporte para ilustração e escrita era o pergaminho. Só depois que o papel apareceu na Europa Ocidental, trazido pela expansão árabe. O papel já existia na China desde o final século I.]

3.2 Manuscritos iluminados – arte monástica

O Cristianismo é, efetivamente, a religião dos livros. Com essa definição, os mosteiros foram responsáveis pelas ilustrações destinadas aos livros do Catolicismo - as iluminuras.

No interior dos scriptorium (local do mosteiro destinado a criação dos manuscritos.) existiam carteiras, tinteiros, tintas pretas e tintas vermelhas de diversas origens. A preta, por exemplo, era originária da excrescência dos ovos de insetos deixados nas folhas dos carvalhos e posteriormente maceradas. Também era utilizado pigmentos de ouro ou folhas de ouro, a chamada crisografia, e pigmentos de prata ou folhas de prata, a argentografia.

Os monges que trabalhavam nas iluminuras eram classificados como: monge copista (antiquari), monge ilustrador (miniator – que, progressivamente, passa a designar todo aquele que executava qualquer ornamentação.) e monge rubricador - que se dedicava a fazer as letras capitulares das Iluminuras (Rubrica vem do latim rubrica, que significa vermelho, porém nem todas as capitulares eram dessa cor.).

3.2.1 O Manuscrito de Kells

O Livro de Kells (800 D.C) é o mais importante e maravilhoso objeto (apesar de não concluído) da chamada Arte Insular a sobreviver desde os primeiros séculos da Cristandade Celta. Cada página é magnificamente ornada com elaborados padrões decorativos e animais míticos que refletem a influência da tradição do trabalho com metais que marcou o período.

Escrito em latim, o Livro de Kells contêm os quatro Evangelhos do Novo Testamento, além de notas preliminares e explicativas, e numerosas ilustrações e iluminuras coloridas.

Monograma da Encarnação
Deus vivo e encarnado - Iniciais de Cristo
em grego - Livro de Kells
Ele deve seu nome a Abadia de Kells, situada em Kells, no condado de Meath, Irlanda. Os monges eram originários do Mosteiro de Iona, localizado numa das Ilhas Hébridas, situado em frente à costa oeste da Escócia. Iona possuía uma das comunidades monásticas mais importantes da região desde São Columba, o grande evangelizador da Escócia. Devido a multiplicação das incursões vikings, Iona tornou-se perigosa e a maioria dos monges partiu para Kells, levando o manuscrito para lá.

Tamanha era a fantasia materializada nessas iluminuras pelos escribas e monges do Mosteiro de Kells que sua obra foi considerada por um cronista do século XIII “não o trabalho de homens, mas de anjos.”.

O livro encontra-se exposto permanentemente na Biblioteca do Trinity College de Dublin – Irlanda.

3.3. Mudança – Arte Carolíngia

Enquanto as ilustrações ocorriam nas ilhas, no continente europeu, o chefe dos francos, Carlos Magno, através de uma série de vitórias militares, consegue centralizar o poder na Europa. Depois, em 800 D.C., ele é coroado pelo Papa o Rei Cristão do Ocidente.

Nesse período, há um esforço para recuperação dos padrões clássicos da arte da Roma Antiga - o que foi chamada Arte Carolíngia. As iluminuras ganharam traços da cultura romana clássica. E os monges passaram a trabalhar nos palácios.

3.3.1 O Livro Vermelho de Montserrat

O Llibre Vermell de Montserrat (O Livro Vermelho de Montserrat) é um manuscrito iluminado contendo canções do final da Idade Média. Foi escrito em torno de 1399. Seu nome provém da encadernação vermelha que recebeu no século XIX. Originalmente possuía 172 fólios duplos, dos quais 32 se perderam. 
Canção Stella Splendens
Livro Vermelho de Montserrat

As 10 composições que restam são todas anônimas. O Mosteiro foi um famoso local de peregrinação católica naquele tempo, possuindo um santuário da Virgem de Montserrat. As músicas do manuscrito são, na maioria, louvações a Virgem. Os textos das músicas são em catalão e latim e o estilo musical sugere que datam de bem antes da ocasião em que foram compiladas. 

Ele, hoje, está no Mosteiro de Montserrat, nos arredores de Barcelona, na Espanha.

Sua relativa simplicidade e belo desenho melódico fizeram com que as canções fossem gravadas por conjuntos contemporâneos dedicados à música medieval. 

Músicas

1. Canção: O virgo splendens (fol. 21v-22) (Oh Virgem esplendorosa)
2. Virelai: Stella splendens (fol. 22r) (Estrela esplêndida)
3. Canção: Laudemus Virginem (fol. 23) (Louvemos a Virgem)
4. Virelai: Mariam, matrem virginem, attolite (fol. 25r) (Louvemos Maria, nossa Virgem Mãe)
5. Virelai: Polorum Regina (fol. 24v) (Rainha dos pólos)
6. Virelai: Cuncti simus concanentes (fol. 24) (Cantemos juntos)
7. Canção: Splendens ceptigera (fol. 23) (Rainha esplêndida)
8. Balada: Los set gotxs (fol. 23v) (Os sete gozos)
9. Moteto: Imperayritz de la ciutat joyosa/Verges ses par misericordiosa (fol. 25v) (Imperatriz da cidade feliz/ Virgem, se por misericórdia)

10. Virelai: Ad mortem festinamus (fol. 26v) (Nos apressamos para a morte)

3.4 Fim de um período

Todo esse mundo veio abaixo com o nascimento das primeiras universidades no século XIII, onde os estudantes necessitavam de livros que fossem produzidos mais rapidamente, mesmo que fossem menos bonitos. Com a prensa de Gutemberg, em 1455, o declínio das iluminuras se iniciou.

No século XVI, as luzes dos manuscritos iluminados apagaram-se de vez. Na Inglaterra, com Henrique VIII e a fundação da Igreja Anglicana, muitos deles foram queimados e monastérios dissolvidos.

Alguns conseguiram preservar os livros que foram proibidos e trouxeram, assim, a história dessa rica arte para os dias de hoje.

A Universidade de Cambridge possui uma das maiores coleções de manuscritos iluminados do mundo - uma gama de diferentes tipos de livros religiosos.

Graças a perseverança dos antigos monges e técnicas de conservação avançadas, podemos testemunhar também o que, antes, era reservado somente para os olhos de Deus.

Recomendações

Filme

O Nome da Rosa (1986) - uma das obras primas de Umberto Eco que virou filme pelas mãos do diretor Jean-Jacques Annaud (Guerra do Fogo/1981). Através de misteriosos assassinatos em uma abadia, o cotidiano dos monges e as iluminuras são mostrados em seu esplendor. Com Sean Connery, Cristian Slater e F. Abraham Murray.

Livro

Idade Média, Bárbaros, Cristãos e Muçulmanos - Umberto Eco - Umberto Eco, com a colaboração dos mais importantes medievalistas de diversas disciplinas, nos leva em uma viagem envolvente e surpreendente através da sociedade, arte, história, literatura, música, filosofia e ciência deste período intenso da história da civilização europeia.

Disponível para compra em: Livraria Cultura (clique aqui)

Música

Jordi Savall & Hespèrion XX - Llibre Vermell de Montserrat (2010) - através de Jordi Savall, compositor e regente catalão, especialista em música antiga, e seu grupo, Hespèrion XX (agora Hespèrion XXI), este álbum traz uma performance energética e sofisticada das canções do Livro Vermelho de Montserrat.

Disponível para compra em: Google Play (clique aqui)

Luar Na Lubre – Les Set Gotxs/Faixa do álbum Mar Maior (2014) - O grande grupo galego mostra uma versão ainda mais energética e animada da canção que faz parte do Livro Vermelho de Montserrat.



Fontes

Meio eletrônico - Documentários e aulas

Illuminations Treasures of the Middle Ages - BBC. Ano 2008. Em Inglês.
História da arte II - UNESP - Iluminuras medievais: arte monástica - Parte 1. 
História da arte II - UNESP - Iluminuras medievais: arte monástica - Parte 2.
História da arte II - UNESP - Iluminuras medievais: arte monástica - Parte 3.

Meio eletrônico - E-books

Dicionário da Idade Média. Organizado por H. R. Loyn. Google Livros. Várias páginas consultadas. Em Português.

Livros 

Idade Média, Bárbaros, Cristãos e Muçulmanos. Umberto Eco. Várias páginas consultadas. Editora D. Quixote Books. ISBN 9789722049924. Em Português.
1000 Lugares para Conhecer Antes de Morrer. Patricia Schultz. Página 42. Editora Sextante/Gmt. ISBN 8575422162. Em Português.

Meio eletrônico - Artigos e Postagens

À descoberta da cor na iluminura medieval com o Apocalipse do Lorvão e o Livro das Aves - Departamento de Conservação e Restauro - Faculdade de Ciência e Tecnologia - Universidade Nova de Lisboa - Arquivo Digital - Iluminura Medieval. Em Português.
A luz e a sombra da iluminura - História, imagem e narrativas. No 15, outubro/2012 - ISSN 1808-9895. Em Português.

Outros

Constantino Promulga o Edito de Milão - Opera Mundi - Uol.
Livro de Kells - Wikipédia em Português.
Livro de Kells - Wikipédia em Inglês.
Carlos Magno - Wikipédia em Português.
Arte Carolíngia - Wikipédia em Português.
Livro Vermelho de Montserrat - Wikipédia em Inglês. 

terça-feira, 20 de outubro de 2015

Grandes Esperanças (High Hopes)

Cena do clipe High Hopes - Pink Floyd - 1994
... E lá para as montanhas, um dia, levarei minha alma, meu corpo e coração...

O desalento não poderia ser mais expressivo. Saudades de tantos acontecimentos nunca vividos, das músicas nunca tocadas, dos sorrisos que nunca floresceram.

Ninguém mais recita poemas e estes tornaram-se sinônimo de fraqueza. Os amores não são mais alimentados com palavras ricas, tecidas com fios de ouro. Padecem agora com onomatopeias ininteligíveis, beirando os rangidos de cães afoitos e raivosos.

A minha alma escuta em apenas uma frequência. E brilha em um espectro invisível aos outros.

Minhas histórias e peripécias pertencem a um mundo interior. E, externamente, ouço sons moribundos e entristecidos. É o estalar de ossos no frio, o frio da ignorância, do desamor, do instantâneo.

Cena do clipe High Hopes - Pink Floyd - 1994
Falta aquela animaçãozinha pelas conversas de boteco para discutir o brega bem escrito e cantado por Nelson Gonçalves. Mas que personagens entrariam nesse enredo? Pois bem, eis aqui as lacunas e os rabiscos da mente.

A vida de escritor não está nada fácil, nem dos renomados, nem dos independentes, muito menos daqueles de fim de semana.

"Não nos enxergam mais!"

Quase ninguém lê com o sabor da paixão na língua, com o sentimento do desbravamento,
da caça, do encontro e do deleite. Muitos são só números, quantidades, isto e aquilo...

Transportei-me para vales verdes encantadores. Voei para Grandes Esperanças, não as de Charles Dickens e sim as de Pink Floyd.

Sobrevivo das histórias que crio e das que escrevo (mesmo sem público), e das várias vidas que vivi e não me lembro.
Cena do clipe High Hopes - Pink Floyd - 1994

O mundo submergiu na lama da simplicidade deplorável.

E não há mais nada que possa ser feito neste século.

Um dia futuro, alguém, ou algo, olhará o céu e perguntará sobre a essência da humanidade. E sua resposta virá através de um livro manuscrito dourado e iluminado, das músicas que foram tocadas em notas de Bach, dos sorrisos que floresceram e dos amores alimentados pelas poesias - todos de uma época que, neste momento, é imemorial. 



***


High Hopes - Pink Floyd - Division Bell - 1994




High Hopes - Pink Floyd - P.U.L.S.E. - 1995 (com tradução em português)



Sobre a canção do Pink Floyd - High Hopes

Uma das músicas mais significativas na minha vida. Sua letra fala sobre um passado cheio de imagens, sons e pessoas. É a metáfora da saída para o desbravamento de um novo horizonte, incerto, mas cheio de esperança. É um saudosismo marcado em cada estrofe. 

A canção foi composta por David Gilmour (um dos mais geniais, para mim, guitarristas e uma das mais bonitas vozes do rock) e Polly Samson, sua esposa, para o álbum do Pink Floyd, Division Bell (sem Roger Waters) de 1994. É o penúltimo na discografia de estúdio do Pink Floyd.

quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Machismo nosso de cada dia - podcast do site Papo de Gordo

Há muito o que falar ainda sobre o feminismo. Nossas batalhas continuam a ser travadas. Mas o próprio incômodo que a maioria dos homens vomita em comentários machistas reflete a proporção e efeito da causa - muito ganhou-se, porém, ainda, existe muito terreno para conquistar!

***

Trecho extraído do site Papo de Gordo
#PAPO DE GORDO 159 – O MACHISMO NOSSO DE CADA DIA#

"Não é novidade pra ninguém que nós vivemos em uma sociedade machista, mas de que maneira isso impacta a forma como nos comportamos e nos relacionamos uns com os outros? Eduardo Sales FilhoMaira Moraes, Lucio Luiz, Dr. Tapioca e Eubalena receberam a convidada Cafeína, a diva do Pauta Livre News, para conversar sobre esse machismo nosso de cada dia. No programa de hoje, tente sobreviver a abertura mais machista de todos os tempos; aprenda o que é manterrupting, bropriating, mansplaining e gaslighting; saiba como as mulheres também podem ser machistas; descubra qual a diferença entre machismo e gentileza; jamais chame uma mulher de pitiática; e tente ensinar o Dudu a usar uma máquina de lavar roupas! Destrua os cintos de castidades e prepare-se para se divertir porque o Podcast Papo de Gordo está começando!"

Duração: 86 minutos

Podcast - Clique aqui!

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

Dia de TPM: a bagunça do + Educação e outras barbaridades que só esse Brasil tem!

1. A Desilusão com o Mais Educação



O Programa Mais Educação é uma maneira de dar aos alunos mais carentes uma assistência extra escolar. É uma tutoria ou, em linguagem mais simples, aulas particulares para alunos menos favorecidos. Tudo no papel é lindo... Até você fazer a prova para a monitoria e passar.

E foi o que aconteceu com a escritora desse Blog e o começo de uma novela.

Fiz a prova da então monitoria e passei (juntamente com mais dois colegas do curso de Física, que também passaram). A prova consistiu em uma dissertação envolvendo os temas específicos do conteúdo do Programa. Um dia depois, mandaram um SMS para o celular de um dos colegas que fez a prova comigo - era a convocação para que a diretoria enviasse-nos para as devidas escolas. Até aí tudo corria bem.

Chegando ao local (que funciona apenas quatro horas por dia - serviço público brasileiro, trabalhando muito, como sempre!), percebi os primeiros sinais de uma total falta de controle e organização. As escolas eram escassas, longe, em lugares perigosos e, muitas delas, pouco acessíveis. Essas sempre sobram! Dadas as poucas opções, fui para uma escola mais distante da minha casa que o Lugar Tão Tão Distante. Assim, saí com um papel para cinco turmas, recebendo R$ 80,00 reais por cada uma, três vezes por semana, no horário da manhã.

A escola desse bairro retrata a falência das gestões das escolas de base. Parece uma prisão - crianças apáticas e banheiros precários. Até o Sol brilhava, naquela tarde abafadiça, de forma entorpecida. A única vantagem era que os ônibus passavam a todo momento.

Cheguei, apresentei-me e, para minha consternação, já havia uma monitora para a área de Matemática. Esta referida como "a filha de fulana de tal" (como alguém pode se direcionar a um profissional nesses termos sem que isso pareça um jogo de cartas marcadas?). Por fim, mandaram-me de volta para a Secretaria Gestora do Programa - precisavam de uma monitora que desse aulas de TODAS AS MATÉRIAS - E, magicamente, descobriram essa necessidade naquele momento (escravidão, bem-vinda!).

Voltei então com "o rabinho entre as pernas" e fui direto para a geladeira infinita.

Simples assim: eles não possuem o controle de quais escolas precisam de monitores e quais as áreas específicas. Reclamei bastante e falei muito. Levei um "Ligo para você avisando quando surgirem vagas." como um "Pessoas que reclamam e não nos paparicam não vão ter essa oportunidade assim." A verdade é que se você não for indicado por um diretor ou tiver alguma contato, dificilmente conseguirá escolas mais perto de casa ou mesmo trabalhar em qualquer uma (Meus colegas, que chegaram primeiro do que eu para pegar escolas, conseguiram e já estão trabalhando.).

Decepção total! Obviamente o dinheiro é importante e necessário, contudo as crianças poderiam aprender e ter oportunidade de conhecer e fixar conteúdos, principalmente nas áreas de Matemática, Astronomia e Linguagem. Não estou gabando-me (talvez um pouquinho).

Por que existe essa prova se não há vagas suficientes para monitores? Que baita cilada! Bela maneira de começar a ensinar - não ensinando NADA!

Estou aguardando... E, provavelmente, ficarei só nisso.


domingo, 4 de outubro de 2015

Rock In Rio 2015 - Balanço Geral

Mais um Rock In Rio aconteceu e a constatação é óbvia: perdeu-se muito da sua essência. Porém essa edição poderia ter sido formidável, afinal, aniversário de 30 anos do festival... Só que não foi bem assim...

Dias: 18, 19, 20, 24, 25, 26 e 27 de setembro de 2015.

Atrações

1 - Queen (18 - Palco Mundo) - Tirando o Adam Lambert, meus queridos Roger e Brian continuam bons. Mas a sabedoria do John Deacon em fugir de presepadas continua intacta.
2 - Metallica (19 - Palco Mundo) - Continuam bons, mas andam dando sinal de cansaço.
3 - Mötley Crüe (19 - Palco Mundo) - Atestado definitivo de aposentadoria urgente!
4 - Paralamas do Sucesso (20 - Palco Mundo) - Ótimos como sempre! Já fui a um show deles e continuam com a mesma energia.
5 - Elton John (20 - Palco Mundo) - Impecável!
7 - Rod Stewart (20 - Palco Mundo) - Excelente!
8 - John Legend (20 - Palco Sunset) - Muito bom, apesar de um show mais intimista.

Dia 24 - Não vi nenhum. Não são a minha praia - System Of Down, Queens Of The Stone Age, Hollywood Vampires e CP 22.

9 - Faith No More (25 - Palco Mundo)- Excelentes, apesar da quase morte do querido doidão Mike Patton e do público morto f$%&$$#... 
10 - Slipknot (25 - Palco Mundo) - Não curto, nem pelas músicas e nem pela maioria do público. Mas os caras são inteligentes.

Dia 26 - Não vi nenhum, apesar do Lulu Santos ser ótimo. Do resto... Hahahahahahahahahahaha... (Rihanna, Sam Smith, Sheppard)

11 - A-ha - (25 - Palco Mundo) - Surpresa! Eu amo a-ha, tenho tantas coisas da banda, mas não esperava um show tão bom!!!
12 - Katy Perry (25 - Palco Mundo- Quando vi a guitarra borboleta, desliguei a TV. Não dá... Meu Jesus na cruz!!!

Organização e preços

Pensei e repensei. Ingresso, pelas atrações, tudo bem, falando, claro, de quantidade de atrações e não pela qualidade. Porém comida superfaturada, meio de transportes ruins, sacrifício imenso para ir, furtos dentro do evento, etc, etc. Fora ainda os escândalos pelas condições de escravidão dos empregados das empresas terceirizadas de alimentos do festival, vide a tal Batata do Cone. Vergonha! Melhor esperar um show isolado ou ir, um dia, para o festival Hard Rock Calling em Londres! Se liga, Rio! As Olimpíadas estão bem aí!

Rock in Rio registra cerca de 50 casos de furto em seu primeiro dia MTE diz que lanchonete tinha trabalho análogo à escravidão no Rock in Rio

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Curiosidades - Sereias e Sirenes - O engano contextual dos tradutores - Parte I

Sim, você pode duvidar! As belas e imponentes sereias, juntamente com os adoráveis esquilos, poderiam formar uma quadrilha de usurpadores... Mas calma! Não é nada disso do que você, querido (a) leitor (a), está pensando...

Nunca fui (improvável que seja um dia) a favor do velho e almofadinha parâmetro de que saber falar e escrever em inglês é um sinal de inteligência e conhecimento (talvez, pelas dificuldades, a língua russa e o amável Latim possam ser). Só que alguns tradutores, principalmente os antigos (e não sei por quais razões), transformaram essa máxima em mínima, pelo menos nos casos que veremos. 

Nessa parte I, vamos falar das diferenças entre os termos sereia e sirene.

***

Sereia (Mermaid) e Sirene (Siren) 
As duas não são a Pequena Sereia!


Para nossos tradutores, elas reduziram-se a um nome só - sereia. Mas uma realmente deve ser chamada de SIRENE e a outra de SEREIA. Além de possuírem radicais totalmente diferentes no inglês, seus significados são distintos e confundem até mesmo os nativos da língua de origem, necessitando buscar-se explicações nas raízes mitológicas.

Siren Painter - Pintura das sirenes em
cena de a Odisseia. Vaso pertencente ao Museu Britânico.
Sirenes (Sirens) - Na Mitologia Antiga, elas nunca foram metade peixe e metade mulher (ou homem). No começo, eram apenas três ninfas que serviam a deusa Perséfone (a moça bonita que o deus Hades surrupiou). A deusa Deméter deu-lhes corpo de pássaro e a missão de localizar a raptada. Mas com o fracasso da empreitada, elas desistiram e estabeleceram-se na Ilha de Anthemoessa. Passaram, então, a seduzir marinheiros com seus cantos para que esses se afogassem (o motivo, como sempre na Mitologia, puro capricho!).

Elas aparecem em duas histórias famosíssimas - Jasão e os Argonautas (Jason and the Argonauts) e a Odisseia (Parte da Ilíada). De acordo com o conto de Jasão, as sirenes foram encontradas pelos Argonautas que passaram por elas ilesos, contando com a ajuda de Orfeu que conseguiu abafar o canto das mesmas com os acordes de sua lira. Ulisses, em a Odisseia, navegou amarrado ao mastro do seu navio, enquanto seus homens bloquearam o canto delas com cera em seus ouvidos. Elas não suportaram tal afronta e deram cabo das próprias vidas.

Nereida cavalgando um golfinho
Museu J. Paul Getty.
Sereias (Mermaids) - Elas não cantam, pelo menos na Mitologia. E essas sim são metade mulher (ou homem), metade peixe. Elas estão no folclore e nos mitos desde suas primeiras aparições nas histórias da Antiga Babilônia. O deus peixe-homem chamava-se Era, depois, nas histórias gregas, chamou-se Tritão. E foram os gregos que deram as primeiras descrições das sereias.

A origem grega dos contos sobre as sereias encontra-se na mitologia das nereidas. Elas fazem parte das divindades aquáticas. Segundo Thomas Bulfinch no O Livro de Ouro da Mitologia (Martim Claret, pág. 230-231), elas eram filhas de Nereu e Dóris (Nereu era pai de Anfitrite, esposa de Netuno. E estes dois últimos eram pais de Tritão). Elas ficaram conhecidas como ninfas do mar e estima-se que, na Mitologia Grega, existam cinquenta nomes pertencentes a essa ramificação. Porém as mais conhecidas são: a própria Anfitrite, Tétis, a mãe do herói Aquiles e Galatéia (não confundir com Galatea da história de Pigmalião).

Ao contrário das sirenes, que queriam espalhar a morte e a destruição, as sereias, ninfas do mar, protegiam os humanos, principalmente os marinheiros.

Para saber um pouco mais sobre Mitologia Grega:



Fontes:

Meio eletrônico - artigos e postagens

Knowledgenuts - Diferença entre sereias e sirenes - Site em inglês
Theoi Mitologia Grega - Explorando a mitologia na Literatura e Arte Clássica - Sirenes - Site em inglês
Theoi Mitologia Grega - Explorando a mitologia na Literatura e Arte Clássica - Nereidas - Site em inglês
Monstros Marinhos e Sereias - Lendas e mitos gregos - Adrienne Mayor - Artigo em inglês
Nereidas - Wikipédia em Português
Nereu - Wikipédia em Português

Meio eletrônico - E-books

Mitologia de Bulfinch - Capitulo 22 - A Rede de Literatura - E-book em inglês
Jasão e os Argonautas através das eras - As Sirenes - E-book em inglês
Mitologia Bulfinch - A Idade da Fábula - Google Book em inglês 
Teogonia - A origem dos Deuses - Hesíodo - Estudo e tradução - Jaa Torrano - Google Book em português

Livros

O Livro de Ouro da Mitologia - História de Deuses e Heróis - Thomas Bulfinch
Editora Martin Claret, Série Ouro, tradução de Luciano Alves Meira, 467 páginas, 2006.

Você, caro (a) leitor (a), poderá se interessar também pela postagem do CQ&Sherlock: 
Curiosidades - Esquilos e Tâmias - O engano contextual dos tradutores - Parte II
Sereia - Poema de autoria de T.S. Frank

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Cheiros e saudades

Era um tempo imemorial.

E bem lá no fundo, onde as lembranças mais intocáveis moram, notas de um cheirinho de pré-escola eram gotas de alegria - Mabel e suco de laranja!

Sou só saudade, esse enorme conjunto de átomos dessa matéria dolorosa.

Era um tempo bom... E eu não sabia. Nunca sabemos. 

Tempo dos livros de capas vermelhas, cheios de histórias, guerras, princesas, reinados e lutas. 

Era o fim do mundo. Porém só meu.

Hoje só há lama, fragmentos de corações dilacerados, amizades perdidas, confianças extraviadas, mal entendidos, chateações e pensamentos que deveriam ser guardados.

Todos os amores deveriam ser platônicos e eternos, juvenis e brilhantes. E só amamos assim uma vez. Os outros sempre serão aquém, cheios de lágrimas e sofrimentos, ou monótonos, ou errados, pelas pessoas erradas e situações tortuosas. 

Um dia eu tive meu oceano azul. E agarrei-me a ele com apreço. E esta memória é o calmante para o caos de sentimentos desse presente ingrato e catatônico.

A vida tornou-se cinza, sem graça. E as pessoas desinteressantes, todas elas! Onde estão seus rostos vívidos, cheios de perguntas e cores saltitantes? Perderam-se dentro de mim. São apenas faces e fábricas de palavras.

Saudades das nuvens que profetizavam chuvas magníficas vindas do leste e que traziam o cheiro das folhas verdes e dos espíritos das florestas. Portais eram abertos através do arco-íris. Sentava na praça e elas [as nuvens] eram de todas as cores, rosas, azuis, amarelas... Uma sinfonia harmoniosa no final de tarde. A felicidade estava ali com seu véu e eu não sabia. 

A noite, o mais lindo céu - o caminho brilhante e leitoso da Via-Láctea . Ali depositei meus sonhos. E eles ainda estão lá, mas perdidos, pois eu também me perdi.

Era tudo esperança. 

É agora tudo que resta é o pó daqueles tempos cheios desejos.

quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Crítica da Semana: Brilho de uma Paixão (Bright Star)/2009

Uma explosão de cores em tons pastéis e o fulgor de azuis vivazes. A suavidade do amor expressado através das palavras e construído com primor e delicadeza. Nesse tempo que presenciamos a imposição do amor carnal como o único verdadeiro e possível, a beleza dessa película mostra-nos o que há de mais puro, singelo e (por que não?) revigorante no sentimento primordial que o último grande poeta do romantismo inglês retratou em cada verso de seus poemas.

Produções inglesas de época sempre carregam consigo grandes expectativas. Pudera! Na terra onde reinam os melhores canais de televisão, BBC e ITV, as brigas por audiência são produtivas e trazem trabalhos estupendos. E com os filmes não seria diferente. Eis uma belo exemplo, Brilho de uma Paixão (Bright Star/Austrália/Reino Unido /França/ 2009).

Nos romances, os riscos de cair em um enorme clichê são sempre altos. Porém, nesta película, o amor não consumado em sua totalidade ganha a forma da poesia do inglês John Keats (1795-1821). Keats é um jovem poeta que, pela morte dos pais e da busca pelo reconhecimento de seus trabalhos, vê-se endividado e sem muitas chances imediatas de estabilizar-se. Seu irmão, Tom, há muito tempo doente, acaba morrendo e John muda-se definitivamente para a casa de seu amigo e companheiro de trabalho, Mr. Brown. Brown mora na metade da casa da família de Fanny Browne (1800-1865). John já havia conversado algumas vezes com Fanny em reuniões e festas sociais. Agora como vizinhos, pouco a pouco, o relacionamento transforma-se em um amor puríssimo.

Quem conhece o mínimo de Keats, sabe que ele morreu cedo em decorrência do agravamento da tuberculose que adquiriu um pouco antes. Contudo o modo como o filme apega-se a sutileza do amor entre os dois jovens foge à armadilha do melodramático e carrega uma beleza ímpar de colorir (literalmente) os olhos.

Fanny é interpretada de maneira formidável pela atriz Abbie Cornish e Keats perfeitamente por Ben Whishaw. Wishaw é um ator belíssimo, com traços delicados. Sua figura cativou-me. Não poderia esquecer tal rosto desde Perfume - A História de um Assassino (Perfume: The Story of a Murderer/2006).

A fotografia do filme é primorosa, a trilha sonora é inebriante e a direção é certeira. Aliás, a diretora é responsável, também, pelo filme O Piano (The Piano/1993), que é um dos meus favoritos e conta com a trilha sonora maravilhosa de Michael Nyman.

Brilho de uma Paixão é visualmente espetacular e possuidor de um enredo belíssimo. O amor, com sua enorme gama de ser, é mostrado como um bálsamo. Seus olhos cativantes são capazes de conquistar a mais incrédula e seca das criaturas. Simplesmente obrigatório assisti-lo - um deleite imensurável!


Curiosidade

O título do filme vem do poema de Keats, Bright star, would I were stedfast as thou art (Estrela brilhante! Gostaria de ser fixa como tu és). O original e a tradução encontram-se abaixo.

Bright star, would I were stedfast as thou art
Not in lone splendour hung aloft the night
And watching, with eternal lids apart,
Like nature's patient, sleepless Eremite,
The moving waters at their priestlike task
Of pure ablution round earth's human shores,
Or gazing on the new soft-fallen mask
Of snow upon the mountains and the moors
No – yet still stedfast, still unchangeable,
Pillowed upon my fair love's ripening breast,
To feel for ever its soft fall and swell,
Awake for ever in a sweet unrest,
Still, still to hear her tender-taken breath,
And so live ever – or else swoon in death.

Estrela brilhante! Gostaria de ser fixa como tu és
Não em um solitário esplendor como agora,
Velando como estás, com grandes pálpebras,
As águas movimentadas em torno das praias humanas,
Como um austero eremita da Natureza.
Ou contemplando a agradável máscara da neve por sobre as Montanhas e os Pântanos.
Não – Quieta, imutável como sempre,
Parada sobre o seio maduro de minha amada,
Para que eu sinta eternamente seu calmo respirar,
E acorde um dia numa doce inquietação.
Quieta, fixa, para que eu ouça sua terna e calma respiração,
E assim viva para sempre, ou desfaleça na morte.

Trailer - Brilho de uma Paixão



Fontes