domingo, 21 de janeiro de 2018

Desventuras

Antes de fechar a minha porta, vi o cinturão de Órion entrelaçado pelas nuvens altas e cinzentas. Faz um pouco de frio nas madrugadas do verão, uma espécie de aconchego para dormir sem muitos calmantes.

Meu estômago dói e minha cabeça fervilha. Uma vertigem nauseante toma forma. Preciso de um chá para recompor-me. Não... Eu necessito bem mais do que isso.

The Cure é a minha companhia para horas assim e suas melodias despejam notas em cortinas que balançam em um vento gélido. Pequenas festas a dois seriam muito mais atraentes se houvesse uma companhia que não estivesse interessada apenas em sexo.

De fato, eu não sei escrever de uma forma padrão e digna. Olhe para as minhas narrativas tortas e não lineares, repletas de encaixes defeituosos. E mesmo assim, foi um tanto chocante ver a minha pífia nota na redação do Enem. Que infelicidade! Os meus escritos nunca foram bem recebidos pela bancada acadêmica desse tipo de prova, nem nos tempos áureos de Ensino Médio.

Vivo a ser corrigida - pré-projetos, mapas mentais, trabalhos, artigos... Definitivamente... Encaixo-me em lugar algum. E meu orgulho tem um lado que foi devorado.

Mudanças aguardam-me avidamente. Sou Édipo avistando a Esfinge.

Suspeito que cheguei a um consenso. É quase certo o fim do meu devaneio pela Ciência. Eis um exemplo muito fidedigno de um casamento à beira do fracasso.

Estou muito velha para acostumar-me a ingratidão dos estudos e muito nova para desperdiçar-me em um sistema que escolheu podar todas as minhas pequenas mudas.

Aproximo-me de uma linha tênue entre a tristeza e a loucura...

Outro dia recusei ver o Céu. Achei-me incapaz de encontrá-lo apenas em números e contas secas. Ainda poderei dizer que amo a Astronomia mesmo se abandonar uma formação acadêmica em Ciências? Sei bem que estou em um vale de indagações que visam medir minhas qualificações por quantidades e diplomas. E parece tudo muito fúnebre e doentio dessa perspectiva.

Deus... Como quero mergulhar de vez no mundo da Literatura e das Artes em Geral. E tenho que, antes de tudo, livrar-me de meus próprios preconceitos por pensar que não posso entrar nesse universo. É como abrir a porta de uma festa em que a Elite está preparada para mais uma noite de escárnio.

Falta-me amor, de meu próprio lado. Não há mais Deuses e Deusas para dedicar poemas ou lágrimas. Antes, caía aos pedaços por paixões avassaladoras, causadoras de dor e sangramentos. Era preenchida por algo, um ódio manancial, que transformava-se em palavras afiadas destinadas a um assassinato imaginário. Sou, agora, um total vazio, inerte e andarilha.

A calmaria do meu coração tornou-me apática. Sem eles, ou elas, não tenho nada mais o que esculpir.

Procuro o meu eu de antes, aquele que está perdido em algum canto de um mundo que isolei dos outros por conta dos meus traumas e receios.