"... Nos começos de julho, por um tempo extremamente quente, saía um rapaz de um cubículo alugado, na travessa de S..., e, caminhando devagar, dirigia-se à ponte de K..." (Crime Castigo, Cap. I, pag. 9, Nova Cultural, 2003).
Há sempre um livro especial para os amantes de leitura e, mesmo tendo Sherlock Holmes como um modelo, o meu é
Crime e Castigo de
Dostoiévski.
Sherlock representa uma espécie de mundo que eu gostaria de estar, pois, mergulhada em suas páginas, eu esqueço de todo o
real problemático e consigo divertir-me. Holmes é prático, sagaz e evita qualquer sentimento de cunho nada aproveitável. E é assim que eu gostaria de ser.
Só que Crime e Castigo introduz um personagem mais próximo - um espelho de sensações e modo de vida.
Por isso esse livro de capa azul diz tanto. É uma obra próxima de seu leitor, pois nela está um pouco do seu universo e, principalmente, porque o protagonista, em alguns aspectos, vive as mesmas situações e conflitos do seu público.
Crime e Castigo dispensa mais uma resenha crítica. É um clássico da literatura mundial e de um dos grandes da linha de escritores que a Rússia produziu -
Fiódor Dostoiévski.
Se você, leitor (a), já leu o livro, sabe agora o significado das minhas palavras. Se não, um dia, ao ler a obra, poderá compreender tudo na íntegra.
Lembro-me bem quando lia as páginas dessa obra e visualizava
Rodion Românovitch Raskólnikov em sua agonia, em seus desvarios, no seu cubículo quente, com seus sentimentos conflituosos, tendo pesadelos e febre. E quanto mais o tempo passa, mais claramente vejo essas cenas.
Por aí acabam nossas semelhanças, pois no âmbito do livro, o seu caminho, ideias e, consequentemente, seu ato levaram-o ao caminho do calvário moral e penal.
Estou aqui sentada no calor, com dor de cabeça, pensando em
Ráskol e no livro de capa azul.
Nós compartilhamos a mesma tristeza, dor e devaneios. E ficamos deitados em nossa cela, com nossos corpos febris, a imaginar o porquê de algumas coisas acontecerem. Há muitas coisas para pensar, para analisar - ele não tinha ilusões, tinha delírios. Eu vivo do mesmo jeito.
Por isso gosto de escrever. É melhor para expressar-me sem cair no normal. Existe mais liberdade e não há a pressão do momento. E mesmo vivendo todas as dificuldades imaginadas, Dostoiévski fazia isso de um modo brilhante.
Experimento a desarmonia, essa estranha sensação de estar sempre alguns degraus abaixo. Estou irritada por ter desenhado, em minha frente, esse abismo que separa os que têm tudo com facilidade e aqueles que têm que experimentar o universo da criatura de Dostoiévski.
E, no final, como ele bem falou:
"...Não, de maneira alguma. Divirto-me, mas é à custa da minha imaginação, é uma brincadeira! É isso mesmo, uma brincadeira!" (Crime Castigo, Cap. I, pag. 9, Nova Cultural, 2003)
... Porque a nós, os desprovidos do brilho da lua, dos bens de Minos e do pó de Afrodite, sobra a imaginação, pois ao menos Atenas olhou-nos.