terça-feira, 31 de outubro de 2017

Erotismo

Álbum Lovedrive/1979
Scorpions
A madrugada abriga-nos
em beijos ardentes
com notas lascivas
de dizeres estridentes .

Consumo teu espírito
e penetras tu a minha carne
para terminamos em arcos
brilhantemente goticulados.

Nua estou
e em nuances
formo-me.

Somos a representação
da sedução das horas
mais adentro.

Venhas a mim
e mata a tua sede
toma-me em
corpo e deleite.

Mas assim
que a Aurora
despontar
de mim
nada lembrarás.

Sou apenas teu desejo
e tua utopia.

Porque no fim...
Seremos apenas
veraneios de solidão.




domingo, 29 de outubro de 2017

Cronicidade

"Estou preso em uma fantasia, 
não posso acreditar nas coisas que eu vejo.
O caminho que escolhi, agora, levou-me a um muro.
E, a cada dia que passa, sinto mais e mais
como se algo estimado tivesse sido perdido.
Levanta-se, agora, diante de mim,
uma barreira de silêncio e escuridão entre
tudo que sou e tudo que eu queria ser.
É apenas uma farsa, elevando-se,
marcando os limites que meu espírito
poderia apagar." 

(The Wall, canção por Kansas, escrita por Livgren
 e Steve Walsh. Leftoverture/1976)


Não sabia se voltava a escrever. E isso arrastou-se por alguns bons dias. E se você perguntar-me o porquê, responderei prontamente pela escrita de hoje.

Há um tempo venho oscilando como um pêndulo frio de metal. Percebi que morri, não por completo, mas estou esvaindo-me em forma de poeira.

Carrego uma tristeza imensa e meu peito pesa. E isso piorou muito por eu ter voltado a morar com a família. São relações muito delicadas, construídas muito debilmente. Sinto-me extremamente oprimida e um grande fracasso.

Ao chegar nesse ponto, indaguei-me se alguma vez, nessa vida deprimente, eu deixei de ver-me dessa maneira. E a resposta assustou-me. Pois, analisando toda a minha trajetória, vi que eu estava desde sempre mergulhada na lama do eu desacreditado.

E eu também faço-lhes uma pergunta: como conseguem ler esses textos? Quem quer saber de tristura e melancolia em um mundo tão esfuziante como esse? Cheio de possibilidades e arcos coloridos.

Sou uma escritora desonrosa, apática e que traz um mundo pálido e cinza. Se todos os meus textos fossem impressos, não me surpreenderia que fossem estes queimados em grandes labaredas.

O impuro deve ser purificado pelo fogo, não é o que dizem?

Talvez seja hora de assumir que estou doente mentalmente.

A minha dor na coluna voltou. E, como todo padecimento permanente, esse é um daqueles momentos de crise que pode durar dias. E, mesmo que eu tente, nunca saberei detalhar o medo que sinto quando ela reinstalar-se em mim. Não é somente a dor física, se assim o fosse, viveria como todos os que têm uma discopatia degenerativa - agarrando-me a grandes esperanças. Junto com esse calvário, eu enfrento acusações, caras de desgosto e as piores profecias... Ah, esses oráculos... Penso eu que nasci amaldiçoada.

Há três dias eu só quero dormir e ficar no escuro, quieta e imóvel. Estou quase num estado de estupor. Não tenho vontade de sair, nem de conversar com ninguém. Olho algumas pessoas e já as considero minhas inimigas mortais. Deixei muitos conhecidos de lado. Outro dia mesmo tratei um friamente, sem muita conversa e o encarava com certa antipatia. Disfarcei-me com cordialidade. As minhas veneradas imagens foram quebradas pelas suas verdadeiras faces monstruosas, suas sujeiras, ambições e crimes.

Gostaria de não acordar mais. E o mais estranho disso tudo é que eu caí neste novo buraco em menos de uma semana. Eu estava um pouco alegre anteriormente, pois tinha posto na minha mente que tentaria achar uma solução para todos os meus problemas e começaria uma nova caminhada.

E esse castelo de areia desmoronou todo nas minhas mãos.

Andei sempre pelas sobras. E, a cada estação, sou assassinada por asfixia.

É... Hoje eu pensei em morrer. E vislumbrei os aborrecidos que causaria por conta dos preparativos para o funeral. Bizarro também foi pensar no falatório sobre a minha alma perdida...

Sim... Eu sou pessimista, e isso potencializa-se com a dor que sinto na lombar. Eu só estou bem cansada.

Será que algum vivente nesse mundo pode compreender essa minha angústia?

A única coisa que restou-me foi beber um café e olhar para o céu azul que nunca irei desfrutar.

Deus tenha piedade do meu espírito, pois, além de uma grande pecadora, com toda certeza, eu carrego uma grande calamidade dentro de mim.



quinta-feira, 5 de outubro de 2017

Unilateralidade nas conversas - uma reflexão sobre os seres humanos in natura

Outro dia, por aqui mesmo, falei do meu gosto por escutar histórias de outras pessoas. Um lado egoísta que revelei sem muito pudor, afinal, isso tira-me do tédio absoluto. Porém, contrariando o meu lado demoníaco, tornei o relato disso extremamente ameno, limitando-me a falar de uma parcela pequena, aquela dos relatos interessantes e instigantes.

Sim, a maioria dessas narrações é um suplício sem precedentes, vulgar, murcha, comum, advinda de gente ainda mais comum, com seus casos amorosos e problemas que não venderiam uma linha sequer em um classificado de anúncios baratos. Enquanto tagarelam, presto atenção nos movimentos de suas bocas e línguas. Os homens, admito, são os meus objetos favoritos nesse parte.

E eu já escutei de tudo nessa vida - Ah, meu bom Deus, quanta paciência tenho...

Pois bem, a política das trocas não funciona nessa situação. E eu explico - essa gente não tem a mesma disposição para ouvir. Falta-lhe um certo senso, mesmo que possa ser fingido, de fascínio pelo semelhante (a não ser que esse seja de interesse sexual, romântico ou econômico.).

Por ser teimosa, aplico-me a autoflagelação de contar alguns fatos da minha vida para alguns desse círculo. E, como esperado, recebo umas poucas linhas com frases pré-fabricadas como resposta. Muitas vezes essas até demoram, ou, sendo clássica, o silêncio ensurdecedor da indiferença deles ecoa pelo ar.

E aconteceu mais uma vez por esses dias. Eu descobri a verdadeira história por trás das ações de um ex caso de alguns anos atrás, a paixão avassaladora da minha vida. E num ímpeto de partilhar a história bizarra, mergulhada em um total frenesi, contei tudo a uma conhecida.

E, bem, veio-me, depois de ser extremamente cozinhada, duas frases resumidas como resposta em um aplicativo de celular desses bastante comuns agora. E olha que eu praticamente narrei um livro em áudio para ela...

O mais interessante nisso tudo é que esta mesma pessoa é uma das muitas que encaixa-se fielmente nas linhas iniciais desse texto. Em outro momento, não muito distante desse, contou-me ela sobre sua vida atual, problemas e dúvidas. Eu dei um suporte específico em uma situação grave até. Obviamente, os supostos amores, assunto preferido da unanimidade, foi o carro-chefe nesse confessionário. Cabe-me aqui dizer que sua limitação é notada às vistas. Porém acreditava que, culpando de antemão um desvario meu, este ser, ao menos, não tornaria-se monossilábico e enlatado - Que grande, grande engano!

Mais adiante vi, por meio de uma rede social (o oráculo das podridões), que a mesma estava ocupada estudando e... Escutando música... Certo, ora! Um motivo justo. Não, calma aí um bocadinho... Quando suas lágrimas vieram à tona e ela precisava urgentemente desabafar, não lembro-me de ser indagada se eu estava ocupada... O que recordo-me é de ter dito - Vem agora para cá!

Por mais frívolas e restritas que determinadas pessoas possam aparentar ser (e de fato é assim), elas, em seus instintos primitivos, tem a esperteza intrínseca em sua essência. O ser humano é, naturalmente, egoísta. Um fato. Mas alguns, lapidados e muito maquiavélicos, conseguem mascarar essa predisposição em benefício próprio, teatralizando e suportando muitas situações que odeiam. Uma hora, ou outra, isso servirá. Já os primeiros... Acabam afundados em sua lama, procurando outros para contar suas proezas de botequim.

Chafurdar na areia com água é a vida de muita gente. E eu gosto muito de observar esse cenário - há algo de muito misterioso na degradação humana.

Contudo deixo aqui meu agradecimento a esses seres tão convidativos. Se não fosse por suas vidas tolas e seus atos odiosamente grotescos, metade dos meus escritos não existiria.