terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

O espírito sem as paixões inquietantes & a tragédia da quietude

Liv Ulmann e Edward Albert
em 40 Carats/1970
Quando revejo a frequência com que escrevia por aqui, sempre vem a mim a mesma pergunta: o que mudou? Bem, com o fim do curso de História se aproximando, restando apenas a monografia e o estágio final, parece-me que eu redigi muito para ele e pouco para os meus sentimentos. Concluo, depois de construir artigos e relatórios (que exigem uma grande revisão depois), que a inspiração e o ânimo para fazer o que fazia antes no blog esgotaram-se antes mesmo de eu começar a ter uma ideia. Ou... Há alguma outra coisa? Muito mais profunda? Seria simplesmente porque perdi o estímulo de outrora, da mulher apaixonada por pessoas e por assuntos inquietantes? A intensidade move-me, isso é certo. Preciso de um coração partido, de um amor intenso, vivido e sofrido. De fato, hoje sinto-me sem muito entusiasmo, como em um limbo estranho, azul e pálido. Que esquisito, não é mesmo?! 

Porém esse sentimento de quietude é angustiante. O coração começa a cicatrizar, mas, paralelamente, ele caminha para uma não intensidade assustadora. Com 36 anos, eu gostaria de estar em um tipo de enredo em que as paixões não cessam, só mudam o foco e o objeto desejado e consumido, numa perspectiva feminina mais intimista, prazerosa, longe dos anseios e ardência juvenis e muito, muito distante da morte decretada do sentimento, como no filme 40 Carats com a Liv Ullmann (Deus, que filme delicioso!), em que posso resumir a um gosto de cafezinho quente em um final de tarde do frio tropical.

Estou perto de ser uma historiadora (e professora de História). Sinto bastante segurança nisso. Diferente da Astronomia e Física, que deixavam-me a sonhar, motivada, para depois terminar num fosso escuro e sem volta. Só que, em minha vida inteira, eu sonhei com os telescópios do Deserto do Atacama e não com museus em casarões de pedra e cal. E essa constatação faz-me suspeitar da ligação disso com essa minha falta de paixão pelo outro. Contudo, eu não posso decretar o fim da minha alma assim. Tudo bem... Eu tenho dores crônicas e fibromialgia. Não é fácil manter-me como antes nessas condições. Uma parte dessa apatia é própria da tristeza que eu acumulei. Tenho culpa, é claro. Medos e um gosto amargo me possuem. Não sou mais aquela que viu a constelação de Órion abrir-se como um cego que volta a enxergar. Nem por isso tenho que me condenar a marchar para o destino de uma vida de uma nota só, com medo da fome e da pobreza do corpo e do espírito.

De vez em quando, pego-me a pensar no rapaz dos olhos azuis da cor do oceano tempestuoso. Eram momentos em que eu era mais interessante para mim mesma. E, mesmo assim, eu não quero voltar no tempo. Preciso de cafeína, analgésicos, ópio e um psiquiatra. 

Mia Farrow e Jeff Daniels
em A Rosa Púrpura do Cairo/1985
Eu poderia ser a Cecilia de A Rosa Púrpura do Cairo agora. Só que eu quero um final melhor. Será que eu consigo aceitar esse novo eu que vem mostrando-se ao longo de 11 anos? Os outros podem enxergá-lo na essência? Ou simplesmente só aceitam a juventude, num ciclo sem fim de rotatividade? E por que eu tenho que esperar por eles? Por que eu estou falando disso...? 

Espero, ao menos, continuar a escrever por aqui. Quem sabe, com uma diferente inspiração. Mesmo que seja do mundo bizarro de David Lynch.

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