Desemboquei em um mar de mágoas. Nadei e encontrei terra. Ergui um grande muro e construí meu próprio mundo.
E, dessa perspectiva, veio-me logo fragmentos de vidas multicoloridas, amáveis, felizes, reluzentes, adoráveis, envoltas delicadamente pela manta do amor... Ah, mas a tristeza cai-me pesadamente. É minha vida, única e exclusiva, carrega fardos, pesares e rancor.
Flutuo e meio a águas turvas. E assim é meu cotidiano - incompreendido, desrespeitado e questionado.
A vida é um jogo de cartas marcadas, assim como o espetáculo que vi outro dia: a bailarina, bonita e gentil, agraciada e ovacionada por seu público devoto, desliza suavemente pelo palco com suas sapatilhas vermelhas, em um tilintar de cores: ela nasceu para isso. Lá do alto, a única coisa que vinha-me em mente era a pergunta: "como as pessoas conseguem administrar, sem morrerem afogadas, a própria alegria e bem-estar?".
Apesar de toda a dor, de vez em quando, relembro o único momento feliz que tive, não há muito tempo, em março, numa tarde de um sábado esfuziante, em que pude, por algumas horas, entender e sentir a vida da bailarina da sapatilha vermelha.
Talvez o Destino, em um ato de compaixão, mostrou-me a vida como ela é para as pessoas que a própria escolheu. Nessa estrada cruel e espinhosa, é importante apenas continuar e agarrar-se a minha própria com mais afinco, mesmo que, muitas vezes, cair vertiginosamente pareça ser uma solução das mais viáveis.
Quando deito minha cabeça no travesseiro, depois da rotina de aborrecimentos, penso que, por mais doloroso que seja, as pessoas felizes são a esperança desse mundo tão frio. Afinal, mesmo alheia, a alegria é um bálsamo em dias quentes.
Das muitas pessoas que conheci ao longo desses anos de nova casa, muitas caíram no esquecimento, algumas causaram-me muito sofrimento e outras deixam-me, ainda, desconfortavelmente taciturna. Poucas fazem-me sorrir e essas sempre serão minhas lanternas.
Porém apenas uma, mesmo sendo um cometa fulgurante, mostrou-me uma vida que, muitas vezes, desejei.
Hoje sei que continuo na estrada fria e cinza com os mesmos rostos que causam-me dor. Porém, mesmo seguindo seu próprio caminho e muito distante, esse pequeno feixe de luz que apareceu naquele sábado esfuziante ainda iluminará meu mundo eternamente sombrio por um bom tempo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Querido (a) leitor (a), obrigada por ler e comentar no Café Quente & Sherlock! Espero que tenha sido uma leitura prazerosa. Até a próxima postagem!