Hoje o amanhecer teve sabor atômico de um laranja sufocante.
Gritos, indagações... Minha liberdade nunca existiu. Não tenho privacidade e nem incentivos. E por tudo, depois de toda a sarjeta jogada em mim, querem que eu, forçosamente, erga-me e siga em frente. De fato, eu sou o peso que pretendem livrar-se.
Quantas pessoas sentem-se hoje como eu me sinto todos os dias. Eu queria muito encontrar os meus iguais. Eu desejei. Aliás, foi um dos primeiros pensamentos dessa manhã tenebrosa.
Somente uma coisa mudaria a minha vida neste momento: um emprego. Talvez eu tivesse algum valor. Estou escarnecida, bem de fato.
O ano começa assim - com brigas, dissabores e falta de diálogo. E dentro desse cenário, angustia-me as acusações. Eu pergunto-me, "sou um ser humano péssimo assim?".
É como uma espécie de maldição familiar, ou talvez muitas pessoas entendam por maldizeres.
Desde sempre eu escuto os meus próprios defeitos, dia após dia, como um mantra - as recriminações começam do âmago.
Sinto falta do amor em sua essência, porém esta falta é desde sempre, do tempo imemorial, daquele que nunca pode ser sentido, mas sabe-se que existe.
Quando falo em amor, não é aquele proferido por bêbados, ou por namorados abusivos, ou por pessoas que querem apenas sexo, ou por familiares e suas obrigações. Não, não é nada disso e nunca será.
Todas estas relações acima são vazias e ferem profundamente, deixando cicatrizes ano depois de ano.
Sinto falta de cumplicidade, de amizades no sentido da palavra e de proteção.
Sinto falta de compreensão, de conversas adequadas para resolver problemas.
Sinto falta de sentir-me um ser humano completo. Hoje tenho apenas pedaços mal formados, degradados por chicotadas.
Por Deus, como estou cansada de tudo isso.
Eu fico perguntando-me se o dinheiro e status fazem uma pessoa feliz. Talvez não. Só que a falta dos dois, quando você está no círculo errado de todas as relações da vida, podem levar à loucura sem precedentes.
E pior do que a loucura, é ter a sensação da sarjeta, de alma inferior, de perda do brilho e da vontade de viver.
Todos os dias formam-se as comparações injustas.
Todos os dias é como morrer. Ir ao inferno e voltar apenas para dormir.
E o ciclo vicioso recomeça nos primeiros raios de Sol.
É como gritar e ter uma sacola plástica na cabeça.
Desejei morrer tantas vezes e desejei viver outras mais.
Eu só quero uma vida diferente. Mas para que ela aconteça, eu preciso apenas que deixem-me livre, que não coloquem pesos de crimes e o peso da hereditariedade.
Sou uma pessoa na fogueira. Meu crime foi ter pensado em cruzar o horizonte e alcançar o céu com as minhas mãos.
Que texto cheio de verdades e de emoções. Como sempre escrevendo com propriedade. Parabéns por uma reflexão tão sincera e tão profunda.
ResponderExcluirOlá, querida Marcela. Obrigada pelo comentário, pelas considerações e elogios. Um grande beijos.
Excluir