domingo, 24 de abril de 2016

Esse estrambótico e complicado negócio que é a vida (e a política)

Há, nesse estrambótico e complicado negócio que é a vida, certos períodos estranhos em que o homem considera o universo inteiro como uma simples e enorme farsa, ainda que mal vislumbre em que pode consistir a brincadeira e tenha bastante desconfiança de que esta se realiza à sua custa. Entretanto, nada o desalenta e nada parece valer a pena enquanto está lutando. Engole todos os acontecimentos, ideias, credos e opiniões e todas as coisas duras, visíveis ou invisíveis, por mais encaroçadas que sejam; como uma avestruz de poderosa digestão engole balas e pedaços de pedras.

(Moby Dick, Volume I, página 343, capítulo 49 - A Hiena - Clássico Abril Coleções, São Paulo, abril de 2010, tradução de Berenice Xavier)

Tempos sombrios caíram sobre mim, sobre nós. E não estou falando somente da minha própria vida que poderia ser um roteiro para uma série de TV, uma sucessão de dramas e bizarrices digna de um modelo lynchiano.

Sim - Pelo Golpe de 64!

Sim - Pelo meu pai, minha mãe, meu filho, minha mulher, minha amante loira do celular iphone 6...

E o mundo, o nosso mundo, a nossa jovem ex-Democracia, nascida no ano do meu próprio vislumbre de luz, suspira agonizante, diante de uma política acéfala, aculturada, vulgar, despreparada, oligárquica, patriarcal, machista, defensora de torturas e ditaduras, extremista religiosa - o Estado Laico que dane-se! "Eu quero mesmo é faturar um milhão" - Lava Jato - meus jatinhos particulares!

Ismael, em Moby Dick, não poderia ter descrito seu próprio cenário de desilusão de forma mais atemporal.

Tudo isso é culpa nossa - nostra maxima culpa - criamos monstros. E agora eles irão nos devorar!

Nascemos em meio a lama, tendemos a passividade e ao esquecimento - corrupção, aos montes, nas Universidades (apropriação de bens públicos), nos trabalhos que almejamos, nas empresas que mascaram Planos de Contas, subornos astronômicos e até na nossa própria casa.

Somos todos uns bananas, isso sim! - E formamos uma República cheia delas - nanica, PRATA ou PLOMO, ao gosto do freguês.

Fui uma avestruz. Tive que engoli, em um processo igual ao maldito, cruel e elitista foie gras, desculpas esfarrapadas de UMA LIMPEZA que não passa de uma farsa, uma do tamanho do universo paralelo. E, depois que meus olhos sagraram diante de um DESCALABRO HOMÉRICO, eu vomitei - minha (in) digestão matou-me - a avestruz tornou-se um ganso bem morto.

Nossa política é egoísta. Ela não representa você, nem eu, nem o totó da casa deles. Preocupam-se com seus prazeres satisfeitos e suas ostentações - se ele tem é porque Deus deu (ou o Diabo) e o dízimo gordo dos fiéis, os nosso impostos, a propina. E agora elas todas (as notinhas) reinam na Suíça.

Somos uma piada mundial. Ou seja, todo dia é um 7x1 diferente!

Respiramos ainda o ar de uma sociedade saudosista da escravidão. Há tempos esse ar envenenado atinge os sindicatos, as empregadas domésticas, os porteiros, os estudantes, a galera das Humanas, a UNE, as famílias do Bolsa Família e da Minha Casa, Minha Vida, em mim e em você. Ela (a sociedade) nunca contentou-se em não ter mais seres humanos como propriedade. Vivemos uma era de jovens que cultuam o ódio, porque eles mesmos são vazios, mimados, criados em uma bolha de laboratório - cheios de quereres que ultrapassam o respeito e a liberdade individual. 

Respiramos mais ainda o ar de uma sociedade saudosista de um tempo escuro que também manchou nossa História - 64. Quem em sã consciência defenderia tal atrocidade? E a resposta assusta. Pois falhou-se em tratar criminosos como eles realmente são. Quando um protótipo errado de ser humano defende torturadores e assassinos, a culpa é dele mesmo por ser tão energúmeno. Porém, quando alguns milhares também o seguem... Hum... Isso causa uma certa beliscada incomodante - como não pensar em Hitler, Pinochet, AI-5, Carlos 'Infernal' Ustra...

Quando a História faz seu papel e o jornalismo é sério - bandidos não viram heróis!

A vida tornou-se estrambótica, negra e cheia de incertezas. Nossa Moby Dick nos roubou mais uma perna, ajudada pela nossa própria tripulação. Ahab não contaria com isso nem mesmo em seu pior pesadelo.

E o pesadelo dele agora é o nosso.

quinta-feira, 14 de abril de 2016

Eu o encontrarei

Se os ventos do Norte soprarem
Em terras distantes, muito além
E todos os caminhos negarem-se
De alguma maneira, atravessarei...
... Essas areias distantes do tempo...

... Que contam cada vida
Cada uma com um alento
De todos aqueles que amei.

São as passagens de outrora
Enterradas sobre metáforas
E lembranças esquecidas
De caminhadas vívidas.

Outra parte de mim
Em algum lugar está
Perto, longe, aqui
Ou acima do luar..

Universum: representação do Universo elaborada
e usada pelo astrônomo Camille Flammarion na obra
"L'atmosphère: météorologie populaire", Paris/1888.
Separados
Mortos
Vivos
Anos
Ou momentos

Algum dia
Eu o encontrarei
E saberei sobre tudo
Aquilo que almejei.

T. S. Frank








quarta-feira, 13 de abril de 2016

É solitário andar por entre a gente

Chega-se a uma certa idade e constata-se que todos os ideais morreram, pelo menos aqueles tenros juvenis que alçavam voos altíssimos como os de Pegasus.

Não amar mais é o limbo, o próprio, este descrito com palavras fortes em muitos livros que citam seres moribundos. 

Não confio e não interesso-me. 

E os dias passam em telas embaçadas, um filme em filtro azul, frio e angustiante. 

Decepção e todas as mazelas de uma alma inquieta em busca da vividez humana não me surpreendem mais - puro cotidiano! Depois de alguns anos, descobre-se as mentiras, as bocas retorcidas, o orgulho e a soberba. Todos os sinais estavam piscando em amarelo, violeta e laranja. Porém a cegueira dos sentimentos tratou esta paisagem infernal com um photoshop descarado. 

Não quero mais estar onde estou - este solo infértil, vil e ordinário. 

Este sabor amargo, ácido, corroendo a minha garganta, sufoca-me e lacera o meu interior. 

A solidão é um estado de espírito (ouvi em algum lugar...). E não há nada e ninguém que possa preencher este vazio abissal. 

Todos os dias escuto histórias. E concluí que as pessoas procuram-me para desabafar, falar sobre seus anseios e desejos, muitas vezes indignações e constatações sobre a realidade cruel. Ouço-as atentamente - como seus lábios mexem-se nervosamente, construindo cada frase, derramando cada gota salina de lágrima. Se sou o consolo de cada uma, isso enaltece-me e, como uma maquiagem, preenche, por algumas horas, a lacuna que eternamente existirá. Há uma parte egoísta, obviamente, nesse ínterim - tenho alguém que deseja compartilhar algo - e todos esses contos são uma distração para minha mente cansada. 

Mórbida é esta vida sem prazeres, sem ação, sem mistérios a serem resolvidos, sem risos desprendidos, sem cumplicidade, sem café da tarde que cheira a menta. 

Metade de mim morreu. Há quanto tempo? Não sei.

É solitário andar por entre a gente - percebemos todas as migalhas de atenção que recebemos, as caminhadas tristes e o escutar para não ser ouvido. 

Sinto-me amarrada, presa pela ponta dos pés. Minha voz continuamente é abafada. Há muita raiva gratuita, sentimentos controversos, desejos inertes e sem esperança. 

Daqui há algum tempo, depois das vozes que se silenciam para cantarem em outras árvores, todas as andorinhas pousam suavemente para visitar o gato ranzinza. E, depois que o véu da noite surge, desaparecem, voltando para suas vidas prioritárias. 

Hoje é um dia triste. E, por si só, aqui tem-se toda a explicação. 

E lamentos podem ser ouvidos em forma de miados abafados.