sábado, 28 de dezembro de 2013

Curiosidades cinéfilas: Overture, Intermission e Entr'acte

Caro (a) leitor (a), imagine comigo...

Você estava numa boa, pensando em qual filme assistir nesse fim de ano letárgico e preguiçoso e teve a brilhante ideia de ver Ben-Hur ou algum outro com um nome em Latim, quem sabe Quo Vadis...

Comprou aquela Coca-Cola geladinha, fez a velha pipoca de micro-ondas, colocou o DVD e ... Durante uns 6 minutos você se deparou com um grande OVERTURE, enquanto tocava a trilha sonora do filme. "Tudo bem, já passou", você pensou. E não é que duas horas depois apareceu um grande INTERMISSION e logo em seguida um ENTR'ACTE e mais e mais trilha sonora de novo...

NÃO É POSSÍVEL, Jesus!

Mas por que isso aconteceu?
Vamos às respostas! E, quem sabe, você passará a gostar desse velho modelo dos filmes de antigamente.

 
Overture Ben-Hur/1959

Overture – era uma abertura estática que tinha a finalidade de mostrar a trilha sonora, geralmente usada para aqueles filmes épicos, como Ben-Hur e Quo Vadis, por exemplo. O uso dela permitia que as pessoas entrassem no cinema e se acomodassem antes do filme começar. Também era uma premissa para mostrar a essência do filme. O ano de 1979 marcou o desuso da Overture, sendo que os últimos filmes a utilizá-la foram Jornada nas Estrelas – O Filme (Star Trek: The Motion Picture) e Abismo Negro (The Black Hole). Porém, a partir do último citado, as Overtures foram utilizadas somente nas chamadas roadshows, que são mostras limitadas de filmes, sendo retiradas no momento em que esses entram em circuito nacional, como aconteceu com Greystoke: A Lenda de Tarzan, o Rei da Selva (Greystoke: The Legend of Tarzan, Lord of the Apes/1984), O Estranho Mundo de Jack (The Nightmare Before Christmas/1994), Dançando no Escuro (Dancer In The Dark/2000), Cruzada (Kingdom of Heaven/2005), mas preservada na Versão do Diretor e Melancolia (Melancholia/2011).


Alguns filmes que utilizaram a Overture:

· King Kong (1933)
· E... O Vento Levou (Gone with the Wind) (1939)
· Vidas Amargas (East of Eden) (1955)
· Ben-Hur (1959)
· Spartacus (1960)
· Amor, Sublime Amor (West Side Story) (1961)
· Lawrence de Arábia (Lawrence of Arabia) (1962)
· Minha Bela Dama (My Fair Lady) (1964)
· 2001: Uma Odisséia no Espaço (2001: A Space Odyssey) (1968)
· Jornada nas Estrelas – O Filme (Star Trek: The Motion Picture) (1979)
· Abismo Negro (The Black Hole) (1979)


A lista completa dos filmes que utilizaram Overtures você encontra AQUI.

Intermission Ben-Hur/1959

Intermission - era o intervalo nos filmes que tinha uma finalidade prática: facilitar a substituição dos rolos de filmes. Porque em um filme Épico, com umas quatro horas de duração, isso precisava ser feito sem deixar o espectador irritado. E servia para mostrar mais ainda a trilha sonora, geralmente, primorosa. O público podia aproveitar para fazer outras coisas também, como esticar as pernas, ir ao banheiro e comprar guloseimas.


Alguns filmes que utilizaram o Intermission:

· O Nascimento de Uma Nação (The Birth of a Nation) (1915)
· E... O Vento Levou (Gone with the Wind) (1939)
· Fantasia (1940)
· Os Sete Samurais (Seven Samurai) (1954)
· Ben-Hur (1959)
· Spartacus (1960)
· O Rei dos Reis (King of Kings) (1961)
· Lawrence de Arábia (Lawrence of Arabia) (1962)
· Cleopatra (1963)
· Deu a Louca No Mundo (It's a Mad, Mad, Mad, Mad World) (1963)
· Minha Bela Dama (My Fair Lady) (1964)
· Doutor Jivago (Doctor Zhivago) (1965)
· Help! (1965) [Beatles] (Intervalo inferior a 10 segundos)
· A Noviça Rebelde (The Sound of Music) (1965)
· Grand Prix (1966)
· 2001: Uma Odisséia no Espaço (2001: A Space Odyssey) (1968)
· O Poderoso Chefão (The Godfather) (1972)
· Os Cowboys (The Cowboys) (1972)
· Mais Forte que a Vingança (Jeremiah Johnson) (1972)
· O Poderoso Chefão Parte II (The Godfather: Part II) (1974)
· Monty Python - Em Busca do Cálice Sagrado (Monty Python And The Holy Grail) (1975)



Intervalo inferior a 10 segundos

· Barry Lyndon (1975)
· Gandhi (1982)
· Neon Genesis Evangelion: Death & Rebirth (1997)


Entr'acte Ben-Hur/1959


Entr'acte - foi feito para aparecer logo após o Intermission, mostrando que era chegado, como no teatro, o segundo ato. Não tinha somente a finalidade de ser um intervalo para a troca de rolos. Como no filme Ben-Hur, o Entr'acte mostra o começo da nova jornada do herói. 


E por que entraram em desuso?

Com o passar dos anos, a tecnologia fez com que a mudança dos rolos fosse imperceptível. Se O Hobbit/2012 fosse de 40 anos atrás, teríamos nele, com quase absoluta certeza, Overture e Intermission (talvez com Entr'acte).


Fontes:

Abertura - Wikipédia em Português
Overture - Wikipédia em inglês
Intermission - Wikipédia em inglês
Entr'acte - Wikipédia em Inglês
Roadshow - Wikipédia em inglês

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Crítica da semana: Sede de Viver (Lust for Life)/1956

"Van Gogh foi o gênio incompreendido, marcado por falhar em aspectos importantes de uma época ainda fechada para a liberdade de expressão. Apenas desejou achar seu lugar no mundo, um mundo em tons de amarelo energético. E com Sede de Viver, Kirk Douglas transforma-se na vivacidade de Vincent - sua vida e suas histórias com a essência de seus quadros - muita intensidade."

Pintores (as) e escritores (as) têm muito em comum - o reconhecimento póstumo. E os (as) maiores (as), quase sempre, são os (as) que enlouqueceram pelo meio do caminho ou sucumbiram à pressão de uma sociedade não preparada para a gama de ideias e opiniões dos mesmos (as), por exemplo: Edgar Allan Poe, o grande escritor dos contos de terror e suspense, que influenciaria Arthur Conan Doyle e Agatha Christie mais tarde, acabaria retirado da sarjeta, delirando antes de morrer; Vermeer, o pintor da luz e perfeição técnica, viu-se na pobreza e, por dever muito e não ter mais condições de sustentar a família, morreu de um ataque do coração. Sendo assim, não foi diferente com Vincent van Gogh. Sua vida curta, cheia de histórias e incompreensão, terminaria de forma trágica aos 37 anos. E coube ao filme Sede de Viver (Lust for Life/EUA/1956) retratar com maestria essa trajetória. A película traz atuações espetaculares de Kirk Douglas (Vicent van Gogh) e Anthony Quinn (Paul Gauguin).

O filme merece ser comentando desde a abertura, com o emblemático Leo The Lion da MGM (em sua época de ouro), passando pelas mãos firmes e certeiras do diretor Vicente Minelli (sim, o pai da Liza e, na época do filme, já divorciado da Judy Garland) e terminando com um mosaico das obras originais de van Gogh vindas de museus e coleções particulares.

A história começa em 1877, mostrando o serviço religioso de Vincent em uma vila de mineiros na Bélgica. Vivendo em condições deploráveis e sem dar notícias, van Gogh preocupa o seu irmão Theo que aparece e o leva novamente para a Holanda. Van Gogh aos poucos recupera-se, porém uma desilusão amorosa o faz mudar para Paris, onde seu irmão Theo trabalha como negociante de artes. Na grande cidade, ele faz contato com diversos artistas impressionistas e conhece aquele que viria a ser seu maior amigo, Paul Gauguin. Influenciado por Gauguin, van Gogh vai atrás de lugares ensolarados para pintar e muda-se para a Bretanha. Algum tempo depois, Gauguin vai morar com ele. A situação precária em que os dois vivem e a deterioração mental de van Gogh fazem com que os dois não continuem juntos. Theo vai em socorro do irmão que pede a ele para ser internado em um manicômio.

O filme possui cores altamente vivas que caem como uma luva no enredo. É como enxergar através dos olhos do próprio Vincent e sentir sua agonia e seu desespero (desconfia-se que o pintor via tudo em amarelo, a chamada Xantopsia, talvez por beber absinto demais, ou fosse daltônico; também há a suspeita de que sofria de esquizofrenia ou de transtorno bipolar). Despojado dos bens materiais, ele estava onde o povo estava, vendo e pintado os agricultores colhendo, os ventos soprando nos campos, a boemia embriagada, as estrelas incandescentes, luzes e mais luzes.

Todo este trabalho rendeu o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante para Anthony Quinn, além das indicações nas categorias de Melhor Ator, Melhor Direção de Arte e Melhor Roteiro Adaptado. Kirk Douglas recebeu o Globo de Ouro de Melhor Ator Dramático daquele ano por seu papel no filme.

Há pouco para reclamar, a não ser minúcias, desta bela obra: a falta da cena completa da orelha cortada (uma das melhores do filme e a mais emblemática da vida de van Gogh) que geraria a concepção de Autorretrato com a Orelha Cortada. Sabe-se que este famoso quadro do pintor foi concebido em 6 de janeiro de 1889 e a orelha foi-se antes, em 23 de dezembro de 1888. Porém a pintura não é vista em parte alguma do filme, nem mesmo no mosaico final.

Não há como finalizar sem mencionar o trabalho da grande lenda das trilhas sonoras: Miklós Rózsa. Responsável pelas composições dos épicos Ben-Hur e Quo Vadis, Rózsa criou para Sede de Viver uma das trilhas mais belas do cinema. Infelizmente a trilha não foi indicada ao Oscar. Um grande erro!

Se você é amante das artes ou só conhece van Gogh porque alguém na sala de aula um dia quis cortar a própria orelha, este é um filme altamente recomendável. Uma das grandes maravilhas de uma época salpicada com o amarelo dourado dos grandes atores, atrizes, estúdios, diretores e composições musicais.

Trailer


Trilha sonora [parte final - a parte da abertura é ainda mais bonita, mas ainda não foi disponibilizada no youtube]

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Notícias do front: épocas e nuances cinzas

Difícil é escrever, olhar ao redor e notar que o tempo desejado foi-se há anos.

Mudaram as estações e de uns meses para cá a inspiração para escrever desapareceu em meio a um nevoeiro de acontecimentos.

Muitas pessoas perderam minha consideração. E, muitas vezes, sair do meu cubículo para lidar com certos tipos é a tarefa mais árdua existe.

Não há como descrever a falta de senso, de cultura e, muitas vezes, bondade que assola a maioria dos jovens. São como robôs, muito bons em um ou dois aspectos, mas que acusam erro em outros mais sutis e humanos.

A pobreza de pensamento é ainda pior junto com agressividade vazia de argumentos. Eis uma narrativa simbólica:

"Um dia estava a escutar música clássica e certa criatura desprovida de qualquer característica requintada ou que a torne humanamente suportável disse que ao menos o funk carioca tem letra."

Sinceramente, diante desse exposto, fico a pensar no fato egoísta de isolamento do mundo.

E não se engane! Essas pessoas são justamente as que têm a oportunidade de frequentar uma universidade.

Eu perdi minha fé em certos aspectos. E muito de vez em quando, há alguns lampejos de salvação. Porém esmorecem diante das facilidades na estrada da vida.

Quanto mais jovens são, mais preconceituosos. E são assim em toda
s as áreas ou padrões que aos olhos dos mesmo não merecem existir. Acho que nesses dois anos, já fui vítima de certas brincadeiras, por exemplo, por escutar Chopin, ou ler um George Orwell, ou ter mais idade do que a maioria, ou ver um filme com Charlton Reston. São fatos inconcebíveis no meu mundo e no que acredito que faça um uma pessoa ser realmente uma pessoa: amar as artes, dar valor ao passado, respeitar as diferenças e basear o futuro em alicerces mais sólidos.

Esses dias sinto que o lugar mais atraente é o meu quarto e arrastar-me para fora dele significa voltar ao mesmo extremamente decepcionada a ponto de querer apenas dormir por uns dois dias antes de ter certeza que quase tudo está perdido em relação ao ser humano.

Continuo nessa caminhada, com paradas e reflexões, então. Não há modo de não sair ferida, mas existem maneiras de, talvez, desviar de algumas pedradas. Defender o que se acredita requer a maior e mais difícil virtude: paciência.


28 anos


Passou-se o dia 22 de novembro e agora mais um ano, dos tantos e muitos que desejo. 
Um aniversário diferente: a velha tristeza sentou-se para comer um pedaço de bolo, enquanto a alegria de um dia pintou-se com notas florais azuis e inundou o ambiente, declamando Vinicius. 

Soneto de Aniversário 

Passem-se dias, horas, meses, anos
Amadureçam as ilusões da vida
Prossiga ela sempre dividida
Entre compensações e desenganos.

Faça-se a carne mais envilecida
Diminuam os bens, cresçam os danos
Vença o ideal de andar caminhos planos
Melhor que levar tudo de vencida.

Queira-se antes ventura que aventura
À medida que a têmpora embranquece
E fica tenra a fibra que era dura.
E eu te direi: amiga minha, esquece...
Que grande é este amor meu de criatura
Que vê envelhecer e não envelhece.

(Rio, 1942)

(Texto extraído da antologia "Vinicius de Moraes - Poesia completa e prosa", Editora Nova Aguilar - Rio de Janeiro, 1998, pág. 451.)